ACTAS  
 
8/28/2009
O Processo de Bolonha: sim ou não? problema ou solução?
 
Dep.Carlos Coelho
Muito boa tarde. Como já tive ocasião de vos dizer em todas as Universidades de Verão há um painel que não é feito no regime de conferência, mas no regime de debate. Qual é a lógica? É termos alguma flexibilidade da estrutura curricular da Universidade de Verão, podemos pôr outros temas que não são temas permanentes, mudam em função dos temas da actualidade e ter protagonistas do 1º plano, não apenas a discutir a matéria, mas fazê-lo de uma forma que permite aos participantes da Universidade de Verão observarem como se pode esgrimir argumentos com posições diferentes e fazê-lo com eficácia, mas também com elegância. Temos 2 convidados especiais que não têm nada a ver com o nosso partido. São grandes académicos de referência, que eu tive a grande ocasião e o privilégio de encontrar na minha vida ao longo das andanças da educação. O Professor Sérgio Machado dos Santos foi Reitor na Universidade do Minho e ainda hoje é reitor honorário da universidade. Foi Presidente do Conselho de Reitores das universidades portuguesas e desempenhou diversas funções, como podem ver no curriculum que vos foi distribuído quer no âmbito da avaliação quer no âmbito da certificação do sistema educativo. O Professor Alberto Amaral foi Reitor na universidade do Porto, foi também como o Professor Sérgio Machado dos Santos membro da Comissão de Reforma do Sistema Educativo, foi do Conselho de Reitores e actualmente está a presidir à Agência de Avaliação do Ensino Superior. Tem um vasto curriculum que também vos foi distribuído e o Professor Alberto Amaral tem como hobbie a literatura e a música, como comida preferida, uma boa carne na brasa, como animal preferido o cão, a mascote preferida dos oradores e dos participantes da Universidade de Verão, sugere-nos um livro de referência o “Animal Farm” de George Orwell, o filme que sugere é o “São Lourenço” de irmãos Paol e Vitorino Taviani e a principal qualidade que mais aprecia é a lealdade. Muito obrigado Senhores Professores por abrilhantarem a nossa universidade com a vossa presença e o vosso saber. A questão que está em cima da mesa é: O processo de Bolonha sim ou não? Problema ou solução? Vão constatar provavelmente que ambos os nossos académicos convidados terão opiniões próprias e se calhar complementares nalgumas áreas, mas pedimos a cada um deles para se centrarem naquilo que possa fazer mais divergência nesta fase inicial e portanto a abordagem do professor Sérgio Machado dos Santos será tendencialmente  mais pró-bolonha e a abordagem do professor Alberto Amaral, pelo menos nesta primeira fase será  de sublinhar críticas ao processo para podermos animar o debate a partir daqui. Ambos os oradores na intervenção inicial vão usar da palavra por 25 minutos. O professor Alberto Amaral com recurso ao powerpoint e a partir daí entramos na fase de debate. Senhores professores muito obrigado pela vossa presença e passo de imediato a palavra ao primeiro orador o professor Sérgio Machado dos Santos.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
Muito boa tarde (palmas). É com muita satisfação que estou aqui perante esta audiência desde logo esta juventude e o potencial que aqui está e também reencontrar aqui o Dr. Carlos Coelho e o Alberto Amaral. Fomos os três membros da Comissão de Reforma do Sistema educativo na década de oitenta e temo-nos encontrado noutros contextos vou apresentar aqui o que chamaria o lado optimista do processo Bolonha, The bright side na expressão de Sibyl Racher  uma das expert que a nível europeu vem a trabalhar nestas matérias. Porque é que eu fui defensor do processo de Bolonha e optimista em relação ao seu potencial para a melhoria do ensino superior? O que vou apresentar é uma posição muito pessoal, fruto da experiência que vivi quer a nível institucional quer na coordenação do ensino Superior a nível europeu. E começava por referir que  as questões da organização do ensino sobre as quais incide a declaração de Bolonha constituem uma preocupação muito anterior à declaração Bolonha. A declaração não surge no vazio. Como foi dito aqui há momentos, fui reitor da Universidade do Minho durante cerca de catorze anos, entre 85 e 98, portanto durante este período anterior à alteração de Bolonha, e tive de me debruçar em pormenor sobre estas questões. Houve na Universidade do Minho uma preocupação pouco habitual nas universidades portuguesas de definir políticas institucionais. Dentro da ideia para o desenvolvimento e da autonomia dentro da instituição, centralizar a definição de política, daí gerar linhas orientadoras e depois descentralizar fortemente a acção nas unidades orgânicas mas essa descentralização funcionando como uma unidade orgânica a nível global da universidade. Isso foi relativamente fácil com algum trabalho mas a obter consenso para políticas institucionais, para a investigação, para a internacionalização, para a interacção com a sociedade ou até coisas sensíveis como uma política para a gestão de recursos humanos. Quando se chegou às políticas pedagógicas foi tremendamente difícil. A comunidade académica claramente não cooperava. Foi possível (com muito esforço em 1991) lançar a avaliação do ensino todos os anos, todos os alunos avaliavam o ensino em todas as disciplinas em que participavam, mas foi um processo muito difícil, exigiu muitos cuidados, confidencialidade de dados individuais, publicação apenas de resultados agregados e com muita, muita reacção da comunidade académica. Mas quando chegou às questões da flexibilização do currículo, mesmo colocando sobre a mesa as estatísticas do género que havia larguíssimas centenas de estudantes da Universidade do Minho que não tinham o seu grau porque faltava uma única disciplina, e nalguns casos essa disciplina nem sequer existia em cursos congéneres nas outras universidades pois claramente nem sequer era essencial, e portanto insistia-se numa flexibilização do currículo, possibilidade de escolha dos alunos que estavam bloqueados nalguns casos em relação a alguns professores. O primeiro debate em profundidade que se fez em Portugal, pelo menos que eu tenha presente, foi em Maio de 98, nos chamados “Encontros de Vidago” ou no âmbito da Associação Empresarial Portuguesa e organizados por uma pessoa que nos é querida neste contexto, o professor Valente de Oliveira e que na altura me pediu para preparar um trabalho, que foi um trabalho de fundo,  sobre o papel do Ensino Superior na formação de quadros dentro da ideia de valorizar ou de pôr em evidência o papel do capital humano para uma economia sustentável, uma economia baseada no conhecimento. Eu alarguei o âmbito desse trabalho à formação não só de quadros mas à formação do cidadão genericamente em termos de uma formação geral, mas esse trabalho permitiu fazer esses estudos uma sistematização dos principais problemas com que se debatiam o ensino superior. E é importante pô-los em evidência porque é daí que depois resultou um grande entusiasmo pelo processo de Bolonha. Tínhamos problemas que resultavam essencialmente da desadequação, da organização do ensino face à massificação das formações iniciais no ensino superior. Na década de 90, a maior parte dos cursos em Portugal, ainda estavam organizados como há 10 ou 15 anos antes, quando o ensino superior era um ensino essencialmente de elites onde a cobertura da faixa etária relevante, abaixo de 10% entrava na universidade uma nata intelectual da sociedade, essencialmente para a formação de quadros. Um ensino altamente elitista onde não havia pós-graduação, pronto um ênfase muito especial na formação inicial, uma licenciatura, a pós-graduação praticamente só existia em termos de quem queria seguir a carreira docente. Com a massificação do 1º ciclo, com públicos muito mais heterogéneos, interesses muito mais diversificados e até a capacidade média de um estudante diferente, o ensino continuava organizado nesses mesmos moldes elitistas, com taxas de abandono e taxas de retenção nalguns casos escandalosas, que constituía um desperdício de tempo e de recursos. Sistematizando, estes problemas centravam-se na estrutura de graus com formações iniciais muito longas, na maior parte dos cursos de 5 anos e alguns de 6, alguns poucos de 4 sem saídas intermédias, portanto o aluno estava vários anos no sistema não concluíam o curso e saíam sem qualquer certificação, em relação às habilitações que tinham obtido, os mestrados eram quase mini doutoramentos, impossível fazer o mestrado em menos de sete anos de formação tendencialmente levava-se mais tempo do que isso, com uma sequência de graus muito rígida mas os principais problemas nem estavam tanto na estrutura de graus; estava mais na organização pedagógica dos cursos. Havia percursos curriculares muito rígidos o que era aprovado não era a estrutura base do curso por grandes áreas científicas mas o plano de estudos que tinha de ser religiosamente cumprido incluindo a tal última disciplina que alguns alunos tinham dependurada, uma grande ênfase nos conteúdos cognitivos, no conhecimento. E como conhecimento começa a evoluir cada vez mais, os currículos tendiam a ser mais cada, os currículos tendiam a ser cada vez enciclopédicos, portanto procurar aglomerar cada vez mais conhecimento, muito pouco relevo dado às competências horizontais, portanto às competências de natureza pessoal e interpessoal que progressivamente eram mais importantes para as novas profissões que estavam a surgir em que não era tão importante o domínio da formação inicial mas essas capacidades de comunicação e de relacionamento e de capacidades pessoais  que dão adaptabilidade ao mercado de emprego, um ensino muito magistral, muitas aulas dadas semi às escuras com projecção de slides de um diálogo unilateral do professor para os alunos, portanto ambiente muito pouco motivador para corpos discentes cada vez mais heterogéneos, e muito pouco propícia a aquisição dessas tais competências pessoais e interpessoais. Porque competências como aprender a trabalhar em equipa, ou de comunicação, não se adquirem com mais uma unidade curricular, não se adquirem ensinando; elas adquirem-se em ambientes de aprendizagem propícios, portanto vivenciando-as, vivendo-as no dia-a-dia, portanto exercitando-as. E portanto levava às taxas de abandono e de retenção que disse. É necessário atacar estes problemas e a comunidade académica estava muito pouco receptiva. Surge a declaração de Bolonha e houve desde logo um ênfase muito grande nos chamados objectivos específicos da declaração de Bolonha. Eu pugnei muito na altura para não esquecer a parte preambular da declaração, o que se pretendia genericamente com a declaração de Bolonha. Pugnei mesmo nas minhas intervenções a nível europeu, integrei o Bolonha follow up group entre 1999 a 2001 (na altura presidia à Confederação do Conselhos de Reitores da União Europeia, com sede em Bruxelas, e portanto estava no grupo restrito de 8 pessoas que faziam esse acompanhamento). E pugnei aí dentro como pugnei a nível nacional em muitas conferências por uma leitura de objectivos amplos da declaração de Bolonha em essencialmente três grandes dimensões: primeiro para mim a declaração de Bolonha reflectia uma preocupação com o reforço da cidadania europeia, portanto contributo para a construção da Europa. E porquê? Desde logo com certeza, pela mobilidade de estudantes portanto por esse possibilidade de imersão social e cultural num outro país. Mas não tanto por isso. Essencialmente pela questão da portabilidade das qualificações. Porque uma questão fundamental da cidadania europeia é o direito de livre circulação, portanto os cidadãos europeus poderem circular livremente. Fisicamente podemos fazê-lo sem problemas pelo espaço Shenghen nem sequer era preciso mostrar o bilhete de identidade, as fronteiras desapareceram. Mas se nós passamos por aqui por Portugal, Espanha, França ou Inglaterra e chegamos lá e os nossos diplomas não nos qualificarem para o mercado de emprego, se houver mecanismos complexos de reconhecimento ou se mesmo para prosseguimento de estudos puserem entraves dessa natureza, é muito artificial esta liberdade de circulação. Para dar um conteúdo real de livre circulação, Bolonha trazia instrumentos importantes de facilitar o reconhecimento das qualificações, a portabilidade das qualificações. Portanto reforço da cidadania europeia. Numa segunda dimensão a preocupação com a promoção do desenvolvimento económico e a declaração não foge a isso directamente mas através do desenvolvimento social e humano, portanto através da criação do capital humano. E aqui eu também fazia uma leitura que já tinha pugnado antes em algumas intervenções. Colocava-me aqui no contexto duma escolaridade obrigatória que atinge o 12º ano. Começamos em Portugal e isso não acontece por acaso e chegou a ser aprovado na Assembleia da República, ainda não foi promulgada mas é uma questão de tempo e está generalizada na maior parte dos países. Ora como a escolaridade obrigatória até ao 12º ano, a formação inicial no ensino superior está imediatamente no pós escolaridade obrigatória. Foi aquilo que para mim foi o 1º ciclo do ensino liceal, agora o 5º e 6º ano, o salto que isto representa. Portanto eu interpretava que neste novo contexto, o 1º ciclo, a formação inicial no ensino superior constitui como uma nova alfabetização para uma integração plena na sociedade do conhecimento. Portanto é o primeiro factor de discriminação positiva em termos educativos para além da escolaridade obrigatória que abrangerá todos os jovens. E portanto todas as preocupações que trazia a declaração de Bolonha em termo de reforçar as formações pós secundárias e de trazer para a agenda política europeia e nacional a questão do ensino superior era extremamente positivo nesse sentido. O terceiro objectivo mais evidente da preocupação com a competitividade no ensino superior na Europa, mas que teve muito uma leitura de proporcionar a venda de serviços educacionais. Acho que até era importante para o Reino Unido e a França e alguns poucos países, mas para mim o mais importante não era nesse aspecto; o mais importante na competitividade do ensino superior, dentro da Europa, é a atracção de massa cinzenta, a atracção da inteligência, trazer doutros sectores. Portanto estudantes de pós graduação inseridos na investigação, com a capacidade de gerar inovação e portanto por essa via contribuir para o desenvolvimento. Parecia-me haver aí uma razão para expectativas muito positivas em relação ao processo de Bolonha, obviamente com os devidos cuidados. Por um lado porque Bolonha parecia dentro deste contexto, destas preocupações, destes problemas ,trazer uma oportunidade para encarar muito a sério estes problemas e para conseguir estimular, espicaçar as comunidades académicas onde estava a ser difícil penetrar. Em termos de reorganizar a oferta formativa em termos dos três ciclos de estudos devidamente articulados, porque a articulação anterior, os mestrados surgiram de uma forma muito caótica, muito casuística e não estavam claramente articulados numa linha de formação, organização em cada ciclo com objectivos de formação repensados e reformulados, porque com a massificação do 1º ciclo, os objectivos dos novos 1º ciclos  não podiam ser os objectivos das antigas licenciaturas quando não existia pós graduação e quando se estavam a formar elites , até agora é preparar os cidadãos para a sociedade do conhecimento, portanto há aqui objectivos diferentes. Uma oportunidade para reorganizar a investigação em articulação com o ensino, que praticamente não existia anteriormente, para institucionalizar a internacionalização, que funcionou desde há muito numa base do conhecimento pessoal mas defini-la em termos de uma política institucional, e de também organizar sistemas internos de garantia de qualidade, que levassem ao desenvolvimento de uma cultura interna de qualidade dentro do princípio fundamental que é a responsabilidade pela qualidade  e pela avaliação compete em primeiro lugar  às instituições do ensino superior. Porque se uma instituição não tiver qualidade no seu interior, não há acção externa que a leve lá. Portanto é no interior das instituições que se ganha ou se perde a talha da qualidade. Por outro lado o processo de Bolonha criou uma dinâmica que foi desde logo evidente. O melhor conhecimento mútuo dos sistemas nacionais e das suas evoluções através de relatórios que de dois em dois anos são feitos não só do stock taking, portanto ponto de situação mas os relatórios trends, os relatórios de tendências que foram preparados e que portanto não só mostrava o que estava a fazer em cada país mas o que é que se perspectivava e portanto isto é um cruzamento de informação ímpar que anteriormente não existia, desenvolvimento de projectos-piloto e começou-se também desde cedo a verificar com alguma convergência em termos de conceitos, de alguns referenciais e de alguns procedimentos e mecanismos como por exemplo o suplemento ao diploma ou o aprofundamento do sistema de créditos ECTS. Obviamente que, em todo este contexto, houve consciência para os perigos potenciais, o professor Alberto Amaral vai-se referir mais a isso, e que portanto se punham sempre sobre a mesa de uniformização, de diversidade, de maior governamentalização portanto abordagens Topdown como infelizmente foi acontecer em Portugal no pós 2005, secundarização das pós graduações pela via do financiamento como infelizmente se verifica em parte e contra o que é o espírito do processo de Bolonha como procurei defender a seguir, mas defender isso não significava que não tivesse de agarrar o processo até porque ele era reversível o que se devia ter era os devidos cuidados. E o que eu pugnei essencialmente foi incentivar as próprias instituições para serem pró activas, para elas não estarem reagir ao processo mas tentar agarrar o processo, liderá-lo, respondendo aos problemas que havia a resolver, e portanto por essa via, ter capacidade, o que infelizmente não foram capazes de o fazer. Mas houve um outro aspecto ao nível de políticas europeias que também me motivou muito. O processo de Bolonha não foi um processo isolado no enquadramento europeu. Em finais de 99, portanto imediatamente a seguir ao processo de Bolonha, o comissário europeu para a investigação, na altura o comissário Philippe Busquin lançou o primeiro draft para a criação do espaço europeu de investigação. Neste primeiro draft que teve uma reacção muito forte, da Confederação do Conselho dos Reitores a que então eu presidia, não havia uma única referência às instituições do ensino superior. Redigiu-se um documento escrito, foi pedido uma audiência ao comissário Buscan que ele concedeu e que correu muito bem, foi uma longa conversa onde estive presente, e que conduziu que no 2º draft, salvo erro em Dezembro de 99, já havia variadas referências às instituições do ensino superior ao seu papel e muito especial em dois aspectos: articulação ensino investigação que é fundamental para desenvolver nos estudantes o espírito crítico, o espírito investigativo, e por outro lado o papel da pós graduação e portanto o relevo da pós graduação na formação de jovens investigadores que era um dos grandes objectivos que era para o espaço europeu de investigação. Quase que em simultâneo, no 1º semestre de 2000, durante a presidência portuguesa é aprovada a Estratégia de Lisboa, com um objectivo extremamente ambicioso, possivelmente têm presente, fazendo da União Europeia a economia baseada no conhecimento mais competitiva e dinâmica do Globo, com mais e melhores empregos e mais coesão social portanto um objectivo extremamente ambicioso, extremamente nobre mas que também, na minha leitura, estabelecia aqui aquilo que eu considero uma relação triangular entre objectivo, economia sustentável baseada no conhecimento e dois vértices de apoio, por um lado o conhecimento e por outro lado a coesão social e colocava aqui uma ênfase que nunca tinha existido em nenhum documento político da Comissão Europeia, em duas questões essenciais para este desenvolvimento da economia baseada no conhecimento. Por um lado a coesão social enquanto investimento nas pessoas, que combate a exclusão social por forma a proporcionar aos cidadãos uma integração tão plena quanto possível na sociedade do conhecimento, evitar os excluídos dentro da sociedade do conhecimento, por outro lado o papel da ciência, da educação e da cultura nesta dupla relação ao serviço da economia sustentável, sem dúvida, mas também ao serviço da coesão social. Isto é um enquadramento ímpar ao ensino superior com visibilidade nas políticas europeias não só na divisão ensino mas também na dimensão inovação e investigação. Esses três processos que surgiram muito em paralelo, quase sem referências mútuas, convergiram progressivamente e no comunicado da reunião de 2003 eles aparecem formalmente já convergentes. É quando, nomeadamente se refere a indissociabilidade entre o ensino superior e a investigação e há pela primeira vez uma referência explícita ao 3º ciclo. Anteriormente só se falava em 2 ciclos, portanto é aí que aparece o 3º ciclo. Portanto é um terreno extremamente fértil para o protagonismo das lições do ensino superior; é importante que ela estivesse na liderança do processo, tiveram uma participação muito forte no Bolonha followup group dos 8 membros do grupo restrito, 2 representavam instituições do ensino superior, eu próprio estava lá através da Confederação do Conselho de Reitores, e a CRE enquanto Associação de Universidades. Defendi nessa altura (e nessa altura parecia haver algum sucesso) que no grupo alargado, para além das representações dos governos, estivessem representadas as instituições do ensino superior, uma representação paritária. Isso infelizmente caiu, porque em Março de 2001 deu-se a fusão entre a Confederação do Conselho dos Reitores e CRE para constituir o que é agora o “European University  Association”. Deste ponto de vista o processo de Bolonha foi um bocado um desastre. Em vez de duas vozes passou a haver só uma, caiu esta ideia da representação da Confederação do Conselho de Reitores; e mais grave no comunicado de Praga, na reunião de Praga foi modificada a estrutura de Bolonha do follow up group, e a própria EUA deixou de ser membro plano e passou a ter um estatuto de observador assim como aconteceu à organização dos estudantes. Portanto nesse ponto de vista aquele hiato e aquela transição correu muito mal. Pronto e sintetizando, quase que a fechar, dentro desta leitura que eu fiz do que eram os problemas do ensino superior, como é que Bolonha poderia constituir uma oportunidade desta convergência de processo Bolonha com o espaço europeu de investigação e com a Estratégia de Lisboa e os desafios que a Estratégia de Lisboa trazia para as decisões do ensino superior e, tendo ainda como pano de fundo os valores universitários defendidos na magna carta das universidades europeias que tinha sido aprovada também em Bolonha em 1988. Portanto com este pano de fundo eu defendia, na altura, como disse tanto a nível europeu como a nível nacional, uma tese, ou se quiserem, um princípio fundamental que para mim deveria informar todo o desenvolvimento do processo de Bolonha o seguinte: que nesses novos enquadramentos e com este enquadramento político o 1º ciclo massificado deixasse de ser algo contra o qual as instituições ainda estavam a tentar reagir, portanto fosse assumido não só como inquestionável, que fosse assumido como desejável. Dentro dessa ideia de tendencialmente proporcionar a todos os jovens qualquer forma de contacto com formações pós secundárias, porque isso é fundamental na sociedade conhecimento. E portanto não lutar contra isso, mas reorganizar as formações iniciais para ter em conta esta realidade. Por outro lado, e dado o espaço europeu de investigação, a Estratégia de Lisboa, o papel da inovação do conhecimento, neste contexto, a meu ver, é investigação e a pós-graduação, não só mantinham como reforçavam ainda o seu carácter de centralidade no ensino superior. Muitos professores universitários sentiam-se um bocado órfãos porque diziam que o ensino superior tinha perdido o seu elitismo. A minha visão é bem diferente. O 1º ciclo de formação não pode ser elitista, é massificado. Mas a importância do elitismo nas formações, mas elitismo no sentido positivo e não discriminatório, em termos de formação de quadros superiores, na formação de investigadores, de promotores da inovação neste contexto era, não só tão importante como antes, mas mais imprescindível ainda. Portanto aumentava ainda o seu carácter de centralidade, como disse há momentos, o que é que deslocava-se para a pós-graduação e portanto as instituições tinham que repensar as suas pós-graduações, não em termos de as massificar, mas em termos de pós-graduações de qualidade para estudantes de qualidade e portanto admitindo claramente a massificação do 1º ciclo. E desta convicção que se as instituições do ensino superior tivessem sido capazes de o fazer e assumir a liderança deste processo elas tinham tido outro protagonismo e tinham evitado alguns problemas que se vieram a conduzir. Tive alguns dissabores, as coisas não correram sempre da forma que eu previa, principalmente as instituições de ensino superior perderam peso a nível europeu como referi, mas a nível nacional também. O Conselho de Reitores perdeu muito peso ou o peso que tinha tido na década de 90. Um à parte rápido, acho que ainda tenho tempo, em 2005 na Conferência de Berna, na 1ª em que esteve o actual ministro, Portugal foi o único país que não teve um representante das instituições de ensino superior. O Presidente do grupo não esteve, não foi convidado. Portanto competia aos ministros levarem os grupos, mas todos os países levaram uma representação como tinha acontecido antes. Portugal foi o único em que isso não aconteceu, isto para mostrar a perda de peso das instituições do ensino superior. A meu ver Bolonha foi uma oportunidade ganha em muitos aspectos. Houve muita evolução claramente positiva, mas foi também uma oportunidade em grande parte perdida. Contudo o processo é irreversível. Houve algum trabalho sério no interior das instituições. Há muito trabalho de cosmética também na reorganização do ensino. Muito trabalho de cosmética, em que é preciso agora refazer. Mas eu pelo menos tinha uma grande esperança no efeito mancha de óleo, que naqueles casos muito positivos e que até com frequência são chamados a ser apresentados como estudos de caso. Mas tenho essencialmente esperança num outro aspecto: Que é a pressão positiva, pronto a dinâmica e pressão positiva que se vai criar através da acreditação e da pressão para o desenvolvimento dos sistemas internos de garantia de qualidade. Trabalho que o Professor Alberto Amaral está a desenvolver através da Agência. Porque, e se tiverem curiosidade em dar uma olhadela aos guiões que neste momento existem é dada uma ênfase muito muito grande a todos estes aspectos fundamentais da organização do ensino, da definição clara e explícita dos objectivos de aprendizagem, como é que eles são considerados, como é que eles são alinhados com os conteúdos curriculares, como é que eles são alinhados com a avaliação dos próprios estudantes. Como é que se faz a avaliação das competências transversais. Portanto eu penso que isso vai ter um efeito pedagógico muito importante e os próximos anos vão ser essencialmente de rever o que correu menos bem e colocar Bolonha nos eixos.
 
Dep.Carlos Coelho
Muito obrigado tem agora a palavra o Professor Alberto Amaral.
 
Alberto Amaral
Em primeiro lugar eu queria agradecer o convite. Para mim é com prazer que eu estou aqui a discutir isto com vocês. Eu considero que Portugal fez bem em aderir ao processo Bolonha. Aliás não tinha alternativa. Portugal é um país suficientemente pequeno e pesa pouco dentro da Comunidade quando outros membros da Comunidade dizem que vão fazer uma coisa e Portugal diz que vai fazer o contrário. E a 2º razão é porque Portugal assinou a declaração e portanto se assinou tem de cumprir. E portanto sobre esse ponto de vista, não há nada a discutir. O que é de discutir, isso sim, é o que é que está por trás disto e que possíveis consequências negativas são que o processo pode vir a trazer. Se o processo e como o professor Sérgio diz, ele é optimista e eu digo que não estou satisfeito, não. A minha visão é uma visão muito mais realista e a minha visão é muito mais a visão de um colega meu que trabalha comigo no meu Centro de Investigação e que fala muito numa separação ou numa decalage muito grande entre o país político e o país real. E são estas ideias de Bolonha e depois a outra é aquilo que acontece na prática. E portanto a minha intervenção vai ser muito sobre esta linha de pensamento. E eu começaria por recordar, que a Europa tem um problema complicado, que é o problema da competitividade no meio, da economia globalizada, porque é? Porque os salários europeus são altos quando eu comparo o salário de um português com o de etíope apesar de tudo, depois da gente se queixar é bastante maior que o do etíope da maneira que o salário de um inglês ou de um holandês, de uma maneira geral, muito mais elevado do que o dos chineses, filipinos, etc e essa gente toda. Portanto tenho um problema de salários elevados, tenho um problema de Estado Providência, de terciário que, apesar de tudo, há uma protecção social aos trabalhadores mas isso na maioria dos países do mundo. Há as consequências do mercado livre porque hoje o capital move-se livremente, e portanto vai procurar os sítios onde é mais barato a produzir e portanto se é mais barato, produzir o que a a Qimonda faz na China, faz na China e o resto são fantasias. E depois uma certa pressão sobre os salários e os benefícios sociais. têm vindo a diminuir os salários e os benefícios sociais, aliás por exemplo m Portugal nota-se que o peso dos salários no custo daquilo que é produzido tem vindo a diminuir, e portanto há uma nova atitude negocial que há em relação às empresas de tentar conseguir (parte disto não se vê). Portanto o grande desafio que se põe à Europa, é como vai manter a competitividade neste sistema globalizado e como (ah, engraçado) e este problema é mais complicado por causa da questão do Estado Providência. A grande questão que se põe hoje à Europa, é como é que ela pode ser competitiva neste mundo globalizado em que se vai produzir onde é mais barato, e se consegue salvar o que é possível salvar do Estado Providência. Imagina que a Europa é o Garfield gordo e bem alimentado, como é que o Garfield vai permanecer gordo e bem alimentado num mundo onde estes problemas de competitividade surgem? E a questão de Bolonha está muito ligada a tudo isto. Ora bem eu queria fazer uma digressão um bocado por questões económicas até à eclosão da crise actual. Há dois economistas que eu gostaria de salientar: são economistas do séc XVIII e séc. XIX que mostra que a economia também não progrediu muito, o Adam Smith  e o David Ricardo. Adam Smith escreveu dois livros muito interessantes “A Teoria dos Sentimentos Morais” e a “Riqueza das Nações”, podem ver as datas claramente séc. XVIII. Ele tinha um conjunto de princípios que ele defendia. A mão invisível do mercado, Adam Smith está ligado à introdução de mercado, a defesa da superioridade do ensino privado, vamos ver que argumento é que ele usa, o ataque ao corporativismo dos académicos, e a defesa dos salários baseados no desempenho. Isto era 4 dos pontos de ordem de Adam Smith. A mão invisível no mercado: o que é que curioso é que os livros dele são muito grandes. Há 2 traduções da Gulbenkian, os livros, os livros são qualquer coisa como mil páginas, e só uma vez é que ele se refere à mão invisível do mercado e como levar o senhor a ser conhecido por isto tem a sua piada. Ele fala só nesta frase, é que ele fala da mão invisível a que orienta a forma como os capitalistas actuam quando investem. Outra questão muito engraçada é a questão da superioridade do privado. Qual era a ideia dele? Ele dizia assim: se uma pessoa vai para o ensino público, o ensino público é sustentado pelo Estado. E portanto isto significa que qualquer que seja que os professores ensinam, eles são sempre pagos e o ensino público mantém-se e portanto vão ensinar, os homens vão para as escolas públicas e aprendem coisas horríveis que não servem para nada na vida deles. Já as mulheres que ficam em casa, naquela altura as mulheres não iam para a escola, ficavam em casa, aprendem aquilo que é útil. O que é que as mulheres aprendem? Aprendem a melhorar as atracções naturais da sua pessoa, a formar o seu espírito para a reserva, a modéstia, a castidade e a economia, a torná-las aptas para serem senhoras de uma família como a comportarem-se devidamente quando forem de facto, portanto ele associava as virtudes do sector privado à forma do ensino das mulheres que é feita em casa quando as mulheres só aprendiam o que era útil e os homens aprendiam tudo o que era uma trapalhada. Aliás ele tem outros exemplos, por exemplo as escolas de dança, o exemplo das escolas de equitação que também tem o seu interesse. E portanto vocês vejam que ele tinha de facto uma ideia do ensino superior privado que é baseado em princípios que todos nós consideramos perfeitamente ridículos. Contra o corporativismo universitário se a autoridade a que os professores estão sujeitos é formada pela própria corporação, a corporação tende a passar, a ser particularmente benevolente e portanto tinha de haver uma intervenção externa que se opusesse à autonomia das instituições ou seja que a própria instituição pudesse resolver os seus problemas e finalmente ele fala nos salários baseados no desempenho e diz que se as pessoas têm o seu salário mais ou menos seguros como acontece com os funcionários públicos em Portugal, isso dá mau resultado porque quer trabalhe quer não trabalhe, acabam por receber na mesma no fim do mês, e portanto não há incentivos nenhuns. Portanto Adam Smith tinha um conjunto de princípios que hoje estão muito em voga, basta pegar nos jornais que se ouve toda a gente a falar nisto, que estão muito associados ao neoliberalismo e estão associados à intervenção do mercado. David Ricardo era um outro economista, que escreveu um livro muito conhecido “Os princípios da Economia Política e da Tributação” de 1817, portanto princípio do séc. XIX, ele era escocês e era muito rico, foi dos poucos banqueiros que se tornou rico sem fraudes (risos), e ele defendia um conjunto de princípios, ele defendia os princípios do comércio livre, ele falava no preço natural e no preço do mercado de trabalho, ele falava nas dificuldades da ligação da capital, ele falava no ajustamento dos salários ao nível de subsistência. Vamos lá a gente tentar perceber o que é isto e eu vou andar um bocado mais depressa. Bem o David Ricardo estudou essencialmente os problemas entre o comércio da Inglaterra e Portugal. Naquele período em que Portugal exportava essencialmente vinho para Inglaterra e recebia em troca ferramentas e têxteis manufacturados. E a ideia dele é que cada país deveria fazer aquilo que sabia fazer ou seja, porque é que Portugal havia de fazer ou não ferramentas se fazia muito melhor vinho. Devia portanto fazer vinho e trocá-lo num regime de comércio livre com a Inglaterra. Vejam o que defende hoje a União Europeia é que cada país se deve especializar naquilo que produz melhor e mais barato e trocar com os outros países. Foi assim que Portugal destruiu a sua agricultura e a sua frota de pescas, por exemplo, porque há quem pesque melhor e há quem faça cereais mais barato do que Portugal. Mas portanto ele defendia de facto o comércio livre. De facto os países deviam viver em regime de comércio livre e com o comércio livre nós resolveríamos todos os problemas. E depois ele define outra coisa que não é conhecido: ele o que defendia é que quando isto tudo estivesse a funcionar em regime de comércio livre, os salários iriam para o nível de subsistência. O que acontece hoje é que quando se consegue fazer mais barato na China ou na África de não sei quê, faz e os salários são mais baixos. E ele defendia, o que é o preço natural do trabalho? O preço natural do trabalho é o salário do trabalhador para o tipo ter um número de filhos não aumentar nem diminuir, portanto tem de ter sempre aquele número de filhos e não morrer de fome. Portanto isto era o preço natural. Porquê? Porque se o salário dele estava acima do preço natural ele entusiasmava-se e começava a ter muitos filhos e fornicava todas as noites e era uma desgraça, e portanto o número de trabalhadores aumentava e ao aumentar o número de trabalhadores descia o salário, porque passava a ter muitos trabalhadores, e se pelo contrário, se vivesse num regime de miséria, o tipo evitava ter filhos e portanto o número de trabalhadores diminuía e o custo do trabalho aumentava. Portanto naturalmente, isto acabava por se equilibrar no nível de subsistência e o ideal seria a gente conseguir fazer as coisas noutros sítios onde fosse mais barato. Qual era o problema que David Ricardo tinha? Tinha um problema de dificuldade de migração de capital. Porque naquele período mudar o dinheiro que estava em Inglaterra para o lado de Portugal era complicado. Havia uma grande insegurança, o príncipe era diferente, e depois as coisas podiam não correr bem. Mas isso hoje está resolvido. E portanto o que ele dizia era que o ideal seria de facto os países puderem trabalhar em regime de comércio livre e procurarem produzir aquilo que sabiam fazer e depois trocava com os outros em regime de comércio livre e toda a gente vivia feliz, os tipos passavam a ganhar menos mas isso é outra coisa, ninguém se preocupa com essas histórias. E portanto basicamente estes dois princípios, por um lado o comércio livre – a organização mundial do comércio - por outro lado as questões do mercado, governavam a vida das sociedades e a gente era baseado, curiosamente, a economistas do séc. XVIII e séc. XIX. Bom, em Março de 2008, em Março de 2000 o Conselho Europeu adoptou a Estratégia de Lisboa. E adoptou a Estratégia de Lisboa como uma forma de aumentar a competitividade europeia. E para o fazer baseou-se numa noção do conhecimento ou seja a Europa só consegue ter um nível salarial elevado, se conseguir produzir aquilo que os outros não sabem produzir. Se a sua mão-de-obra for mais qualificada do que a mão-de-obra dos outros países e portanto conseguir produzir determinado nível de produtos que os outros países não conseguem porque não têm mão-de-obra qualificada. E a Estratégia de Lisboa veio absorver de certa forma o processo de Bolonha, porque as universidades como é evidente serão absolutamente necessárias quando se define este tipo de estratégias. A Estratégia de Lisboa trata o ensino superior como meio para o crescimento económico, portanto é uma condição necessária embora não suficiente, e a ideia é que por meio do conhecimento a Europa conseguirá aumentar a sua competitividade. Portanto a gente percebe o objectivo de Bolonha: de facto é aumentar o nível de formação da população europeia, é destinar uma outra componente que é importar os chineses, os indianos que são muito inteligentes e espertos e trazê-los para cá que é o que os Estados Unidos fazem há muito tempo e tornar a Europa mais competitiva por essa via. Claro que esta apropriação da Estratégia de Lisboa do processo de Bolonha, tem algumas consequências como seja a introdução da noção de empregabilidade em vez da noção do emprego, eu vou passar isto rapidamente… a empregabilidade é distinta da noção de emprego; é que emprego é uma responsabilidade dos governos. O governo, Sócrates disse que ia aumentar 150.000 empregos, considera por isto uma responsabilidade do governo; a empregabilidade é uma responsabilidade individual, atenção. E portanto a grande diferença, se vocês repararem, ao lerem Bolonha é que se mudou o conceito de emprego para o conceito de empregabilidade. Portanto mudou-se do que era o dever do Estado, o dever do Governo de fornecer emprego a quem precisa dele, para uma noção de empregabilidade, ou seja qual é a ideia? A ideia é que uma pessoa tem um benefício por parte do Estado, que é o 1º ciclo generalizado, tem relevância para o mercado de trabalho e a partir daí é obrigação de cada indivíduo de manter-se empregável, ou seja é obrigação de cada indivíduo gastar parte do seu salário todos os anos para fazer cursos adicionais, para fazer o mestrado, para fazer o que quiser para se manter empregado. E portanto há aqui uma grande flutuação nesta mudança de noção de emprego, para a noção de empregabilidade. Mudança do que é a obrigação dos governos para algo que é uma obrigatoriedade individual. Se o indivíduo está desempregado o problema é dele, o tipo não se actualizou, o que é que quer? O tipo não foi fazer nenhum mestrado, que é que vocês querem? O que é curioso nisto tudo, é que os alunos tiveram a percepção muito mais rápida disto do que as universidades e do que os professores. Os alunos tiveram a consciência muito mais rápida, dos problemas criados por Bolonha em termos de equidade social. E se vocês lerem os comunicados da ESID de 2004, que defende um conjunto de questões a 1ª delas é dar prioridade aos aspectos sociais de sustentabilidade e crescimento económico, o 2º que era o Estado Providência dever ser mantido, o 3º é que não querem ver os estrangeiros para serem contratados para os seus lugares, e portanto isto de andar a pescar indianos, chineses e tal, primeiramente é qualidade do ensino superior europeu e depois vão buscar os outros indivíduos, mas engraçado isto era de facto uma percepção muito mais objectiva e bem rápida do que as universidades e os docentes. Depois disseram outras coisas, disseram que todas as medidas relativas ao ensino superior devem ser apoiadas na consulta portanto devem ser amplamente discutidas, a diversidade dos sistemas deve ser mantida e tida em conta, e finalmente que a Estratégia de Lisboa não deve englobar o processo de Bolonha, o que infelizmente não aconteceu. O processo de Lisboa de facto hoje controla significativamente a questão do processo de Bolonha. Na reunião dos ministros na Bélgica, a seguir à reunião de Londres, os alunos foram os únicos que fizeram uma intervenção pública, tentando modificar o comunicado dos ministros da educação. Foram deixados absolutamente sozinhos de forma verdadeiramente vergonhosa, quer pelas universidades quer pelos politécnicos e por todo o ensino superior, quer pela EUA, quer pela ESID, quer pela ENCO, quer pela Euras, etc. Os alunos defendiam, um dos princípios que eles defendiam é que era necessário impedir que os ministros apoiassem um ranking de instituições. E reparem, imaginem que eu quero criar um sistema europeu; há uma coisa que eu sei. Eu tenho de criar um 1º ciclo generalizado, eu tenho de me identificar com o 1º ciclo. Mas não me posso identificar com o 1º ciclo de todas as instituições; e portanto eu vou para um sistema que em vez de ser um sistema diversificado em ensino superior, vai ser um sistema estratificado, em que vai ter como os Estados Unidos que a Europa quer copiar, reparem que os Estados unidos em terem 4000 instituições de ensino superior, mas só 200 é que são universidades de investigação, em 4000 só 200 é que são universidades de investigação, e portanto a solução que a Europa está neste momento a caminhar, é de destruir esta ideia de que todas as universidades são iguais. E portanto vamos caminhar no sentido de ter um sistema em que vai ver o número relativamente pequeno de universidades de investigação competitivo a nível mundial, e um grupo muito grande de instituições que vai fazer formação massificada a nível do 1º ciclo. E não há volta a dar, nenhum país tem dinheiro para ter um ensino superior massificado baseado na investigação. Os Estados Unidos não têm, e se os Estados Unidos não têm dinheiro para isso, nós também não temos. Portanto todos os processo que nós conseguimos ver a implementar, são processos que vão tender a criar instituições de ensino superior que vão ser diferentes. Reparem o que é que os ministros querem? Os ministros querem um sistema de classificação, querem importar o sistema americano usar o gmail para a Europa dizendo se digital serão universidades de investigação, que a Universidade do Minho, do Porto e não sei quê serão universidades regionais, por exemplo ou qualquer outra coisa no género. Portanto e não querem basear-se no sistema de agregação. Isso é uma coisa muito mais rápida. E neste momento encomendaram um projecto no valor de 1 milhão e qualquer coisa de euros, a um grupo holandês, para fazer uma transposição para a Europa, do sistema de classificação americano. Portanto um primeiro sinal extremamente grave é que na última reunião que houve em Bruxelas, os alunos ficaram completamente isolados enquanto os ministros aprovaram um relatório que no fim de contas vai para permitir criar um sistema de classificação da universidade que não é mais do que um ranking. A 2ª questão que se liga a esta e que também surge, curiosamente, nestes últimos anos, é uma iniciativa da OCDE, de pegar no processo de Pizza (nós conhecemos Pizza para a Matemática, não é?), é estender a Pizza ao ensino superior. E portanto vai haver um sistema que é o sistema AHELO, e esse sistema que vai ser agora implementado, e que vai entrar numa fase experimental, visa exactamente permitir classificar as universidades tendo em linha de conta os outcomes do ensino dos alunos. Não sei se vocês sabem que no caso do Brasil existe um sistema de avaliação das instituições chamado PROVAM. O PROVAM consiste no seguinte: cada aluno ao terminar o seu curso, faz um exame e a nota do exame é usada para o ranking das instituições. Portanto se os alunos da Faculdade de Direito de S. Paulo têm todos notas excelentes, a Universidade de S. Paulo tem uma nota excelente e está no topo do ranking; se ao contrário os alunos se comportarem mal, desce no ranking. E portanto o sistema europeu, o sistema da OCDE é um sistema baseado nos outcomes do ensino e a ideia dos outcomes do ensino vão servir para rankiar as instituições. Portento neste momento está em fase de implementação, o que se chama um estudo visibility um estudo de possibilidade de utilização do método e se lerem esse estudo visibility, verão que o proponente da OCDE diz é que depois do estudo de visibility as universidades serão completamente diferentes daquilo que são hoje. Para vos dar um exemplo o candidato a 1º ministro conservador em Inglaterra diz que quando ganhar as eleições, o Secretário de Estado do Ensino Superior fará parte do Ministério da Indústria. Ou seja que as universidades são essencialmente funcionais. E portanto haverá universidades para os quais este sistema se outcome será válido e vai contar, vai ser aquela massa de instituições que faz formação a nível do 1º ciclo, e depois vai haver um conjunto limitado e pequeno de instituições a nível europeu, o que poderá competir a nível mundial fazendo investigação. O que dará de novo uma classe trabalhadora com formação de 1º ciclo e depois um conjunto de investigadores com doutoramentos e formação a nível do 3º ciclo. Infelizmente é este o caminho que eu vejo, infelizmente fiquei muito mal impressionado, foi ver que os alunos ficaram totalmente isolados nas suas preocupações e que ninguém do lado do ensino superior lhes deu a mão. Muito obrigado (palmas).
 
Dep.Carlos Coelho
Muito obrigado professor Alberto Amaral. Vamos entrar agora na fase de debate. Na fase de debate vamos fazer blocos de 2 questões. A que responderão os nossos 2 convidados, cada um deles com 4 minutos de intervenção. Peço para que em nenhuma circunstância ultrapassarem os 5 minutos porque senão não conseguimos acomodar todas as perguntas. Para ser justo vamos alternar a ordem. No 1º bloco 1º responde o Professor Alberto Amaral e depois o Professor Sérgio Machado dos Santos e vamos fazendo zigue-zague à medida que os blocos se sucedem. Vamos então passar para o 1º bloco.
 
Pedro Rodrigues
Obrigado, 1º bloco. A 1ª pergunta é colocada pela Bárbara Castro do grupo amarelo.
 
Bárbara Castro
Muito boa tarde Senhores Professores. É um prazer ter-vos aqui presentes a debater esta questão tão importante para o ensino superior que é o processo de Bolonha. Portanto a questão que eu gostaria de lançar é a seguinte: considerando que o processo de Bolonha assenta na sua essência numa alteração do paradigma pedagógico e que muitos docentes não têm sabido aplicar esse novo paradigma, temos de facto Bolonha em Portugal? Obrigada.
 
Pedro Rodrigues
Obrigado Bárbara. Inês Borges Marques do grupo azul.
 
Inês Borges Marques
Muito boa tarde Professor Sérgio Machado dos Santos e Professor Alberto Amaral. O tratado de Bolonha quando foi assinado tinha por objectivo uniformizar o ensino universitário a nível europeu de forma a facilitar o intercâmbio entre alunos do mesmo curso de diferentes universidades em programas com o programa ERASMUS. A pergunta que eu lhe fazia era a seguinte: até que ponto foi esse objectivo atingido, ou pouco mudou nesse sentido? Obrigada.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado. Tem agora a palavra o professor Alberto Amaral.
 
Alberto Amaral
Bom, infelizmente a questão do paradigma pedagógico não se põe só em Portugal. Põe-se na generalidade dos países europeus e o problema que nós temos em Portugal é o problema que os outros países europeus sentem. Eu chamo a atenção para, curiosamente, pela primeira vez está a acontecer uma coisa muito estranha em todos os países europeus. Estão a tentar implementar as reformas sem dinheiro e a grande diferença que há na implementação do processo de Bolonha, é que não há em nenhum país um fundo que tenha sido especificamente atribuído para implementação do processo de Bolonha, sabendo nós que a implementação do processo de Bolonha para obter os efeitos desejados, exige uma redução do número de alunos por docente e naturalmente maior número de encargos. Quanto à uniformização do ensino universitário, eu nem lhe chamo uniformização mas sim convergência. De qualquer modo não foi conseguida, em particular porque o que se tem verificado em estudos empíricos que têm sido feitos foi que com a redução do tempo formal para três anos na média de bacharelatos, a primeira coisa que acabou foram as opcionais, o que é uma das características fundamentais da flexibilidade e a segunda coisa que acabou foi a facilidade de um aluno em se deslocar durante um semestre e conseguir manter os três anos como meta para concluir para a sua formação. Isso tornou-se mais grave porque em determinados países simultaneamente introduziram mecanismos para fazer com que os estudos fossem mais eficazes. E portanto houve determinados países, um caso típico é o caso da Noruega, um país extremamente rico, que impôs como condição que se o aluno não concluísse naquele período de três anos, a bolsa era convertida num empréstimo e portanto o aluno teria que a repagar. E por isso significa que há um número relativamente menor de alunos nos diversos países que está a utilizar este tipo de facilidades para usar formações no país diferente. Ainda tenho meio minuto só para dizer o seguinte: mais se mostra que a própria comunidade já tomou medidas para transformar parte dos seus financiamentos dos alunos nas suas deslocações, dos alunos europeus pelos alunos asiáticos e da América do Sul ou seja, um aluno que por exemplo frequenta o mestrado europeu e se for de origem asiática tem uma bolsa de 20.000 euros, se for de origem europeia recebe zero. (Obrigado).
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
Bom a questão da alteração do paradigma pedagógico é como referi na minha intervenção inicial o aspecto fundamental, que estava previsto nos objectivos da declaração de Bolonha. E portanto referiu-se se os professores estão preparados para isso. Diria que há casos muito positivos, há muito por fazer. Há casos negativos. Numa universidade que até estava bastante avançada e tinha debatido bastante toda esta questão do conceito de créditos ECTS e o desenvolvimento dos novos programas, assisti num caso, num curso das humanidades em que eles resolveram o problema dos créditos do ECTS de uma maneira extremamente simples: um ano são 60 créditos, portanto um semestre são 30, há 6 disciplinas cada uma tem 5 créditos ECTS já está. Obviamente isto é uma aberração completa. Por outro lado assisti a casos extremamente interessantes de auscultação de estudantes, de uma proposta inicial de prestação dos docentes sobre a carga ou workload dos estudantes, mas depois com inquérito aos estudantes cruzar essa informação e portanto evoluir isso progressivamente e portanto como disse na minha intervenção inicial tenho esperança de que esses bons casos e que estão a ser apresentados como estudos de caso, façam o efeito de mancha de óleo que vão penetrando noutras áreas. Por exemplo, tive realmente o privilégio de estar à frente do lançamento do novo curso de Medicina que é um caso absolutamente exemplar em termos de organização pedagógica, ensino centrado no estudante, não há aulas magistrais, os alunos adquirem uma capacidade crítica e de aprender a aprender absolutamente impressionante e é possível fazê-lo. Dá muito trabalho, mas é possível fazê-lo. Reconheço contudo que há muitos casos em que a adaptação a Bolonha foi uma operação de cosmética, e o que se põe agora na próxima década, o que é que vai ser o processo de Bolonha agora na década seguinte é muito aprofundar este aspecto. Portanto pegar na experiência que veio de projectos, como Tunning e outros de aprofundamento de organização curricular. Levá-los mais longe, área por área. Procurar uma convergência europeia não tanto global de estruturas, mas por temáticas, por áreas científicas. Trazer os stakeholders por exemplo… a maior operação de cosmética para mim de tudo isto é o quadro de classificações nacional que foi agora apresentado à pressa. Quando foi apresentado para Levine, e Portugal apareceu lá com a mancha verde, ninguém o conhecia. O Conselho Nacional não o conhecia, as instituições não o conheciam, portanto foi feito nos gabinetes ministriais e apresentado lá sem qualquer debate sem participação dos parceiros. Pronto é isso que agora é preciso corrigir. Alargar o debate e portanto aprofundar aí. O desenvolvimento dos sistemas internos da garantia de qualidade. Já referi há momentos, vai ser absolutamente fundamental aqui porque os sistemas de certificação desses sistemas e as instituições vão ter um grande incentivo para certificar os seus sistemas internos porque isso vai-lhe flexibilizar a acreditação de cursos, segundo as linhas que a agência está a propor. E pronto, cria um grande incentivo nesse sentido ponham um ênfase tão grande em todos esses aspectos da organização do ensino e do controlo e da interacção, do acompanhamento, do feedback, na realimentação que vai ter aí impacto. Mas vai levar mais alguns anos. 2ª questão: não, o objectivo de Bolonha não era uniformizar o ensino superior. Era promover uma convergência em termos de algum alinhamento de estruturas em termos de uma maior transparência, legibilidade dos graus, em termos de informação pública, não era tornar tudo igual, embora obviamente houvesse uma pressão no sentido da convergência. É um objectivo cumprido em parte, por exemplo, instrumentos como suplemento ao diploma em termos de informação que fornecem para prosseguimento de estudos ou para o mercado de emprego é um instrumento muito positivo. Houve evolução grande em termos de reconhecimento de estudos, mas há aí também muito para fazer. É preciso continuar a fazer aqui trabalho.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado Senhor Professor. Ricardo Abreu do grupo verde.
 
Ricardo Abreu
Muito boa tarde. A maioria das instituições do ensino superior em Portugal não estão a cumprir os objectivos de Bolonha. As reformas não foram feitas, as reformas de fundo que eram exigidas não foram feitas, assistiu-se a uma operação de cosmética em muitos do cursos por parte das instituições do ensino superior, os estuantes não foram em muitos casos ouvidos nestas reformas, para nem falar no mercado de trabalho. Esta é uma opinião muito pessoal: para ser um docente no ensino superior não basta ter apenas a experiência e a capacidade científica, é necessário também ter a sensibilidade e a capacidade pedagógica. Por isso pergunto: a nível do ensino superior é relevante ou não a formação pedagógica dos docentes e se sim para quando essa obrigatoriedade?
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado. Rui Bento do grupo cinzento
 
Rui Pedro Bento
Muito boa tarde Senhores Professores. O nosso grupo estava a discutir durante a tarde os benefícios e os problemas do processo de Bolonha. E reconhecemos uma série de benefícios, nomeadamente a flexibilidade do desenho dos programas de estudos, pois no final do 1º ciclo os Licenciados até poderão hipoteticamente ingressar logo no mercado de trabalho, ou então de continuar a especialização no 2º ciclo. Há porém problemas, por exemplo, para se estar inscrito nas ordens profissionais, na Ordem dos Médicos, Farmacêuticos, Advogados, Engenheiros, etc. é exigido o 2º ciclo de estudos. Sendo que é considerado que o 1º ciclo é generalista, incompleto e que, salvo raras excepções, é parecido com os antigos Bacharelatos. Ora o mercado de trabalho está pouco aberto aparentemente aos novos licenciados de Bolonha, comparativamente com os antigos licenciados pré-Bolonha. Há outras vantagens certamente. Os cursos de 1º ciclo são mais generalistas, mas os estudantes beneficiam de um grande leque de opções. Por exemplo, um engenheiro químico pode tirar o 2º ciclo de Gestão e não de Engenharia Química como dantes. E isso demonstrou… é positivo em termos de flexibilização. No entanto os Mestrados estão francamente desvirtuados. Ora eu dou um exemplo pessoal, eu ainda fiz um Mestrado pré-Bolonha que me demorou 2 nos a fazer, dos quais passei 1 ano e meio a investigar num laboratório coisa que hoje em dia é quase insustentável, uma vez que os alunos não ficaram mais estúpidos. Não têm é tempo, não têm recursos para investigar e não têm tempo para ter a criatividade intelectual que outrora marcou os mestrados, que resposta dar. Finalmente reconhecemos também de aspectos positivos uma existência de instrumentos de comparabilidade de currículos, ou seja, os alunos podem fazer um semestre lá fora, para outras universidades através ERASMUS ou no final de um ciclo mudar para outra universidade. No entanto, todos nós conhecemos exemplos muito desagradáveis de alunos que regressam do estrangeiro e não têm equivalências aos programas, ao contrário do que lhes foi dito e prometido. Sendo assim Senhores Professores, não terá havido uma inflação de grau académicos e que realmente fica bem nas estatísticas internacionais outra os Bacharéis agora chama-se Licenciados, os Licenciados chama-se Mestres, não terá havido uma certa… um certo plafonamento no grau da exigência que nos torna muito menos competitivo em relação, por exemplo, às melhores escolas asiáticas? Muito obrigado.
 
Pedro Rodrigues
Obrigado Rui, dou a palavra ao Professor Sérgio Machado dos Santos.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
A formação pedagógica dos docentes. É absolutamente essencial, mas não se pode dizer que não está nada feito. Por exemplo, no curso da Medicina a que estive ligado nós dizíamos até numa forma muito enfática, que ninguém tocava, entre aspas, nos nossos estudantes sem ter previamente formação, nomeadamente em termos das metodologias interactivas, metodologias activas de ensino. Mas se consultarem páginas de diversas universidades, onde estão expostos os programas de formação que neste momento são disponibilizados para docentes e em muitos casos até trazendo especialistas internacionais, eu recordo por exemplo a Universidade do Minho, há um programa muito intensivo e devo dizer que por exemplo no ano passado cerca de 1/3 dos docentes da Universidade do Minho passou por acções de formação, enfim, não são longas, de uma semana, mas alguns repetindo já acções. Portanto há muito ainda a fazer, mas há uma dinâmica que foi criada, como alguma heterogeneidade talvez entre instituições. Mas é absolutamente fundamental. As metodologias centradas no estudante exigem uma abordagem diferente na criação dos ambientes de aprendizagem e repare, e não é só a formação pedagógica dos docentes, a dos estudantes também. Por exemplo a Universidade do Minho tem um protocolo, um acordo com a Associação de Estudantes da Universidade do Minho em que no início do ano fazem acções de formação para os estudantes, em termos de metodologias de organização do trabalho e outras mais específicas, como consulta de bibliografia, organização de trabalho, etc. Mas para os auxiliar também a eles próprios a entrarem nas metodologias interactivas de aprendizagem, porque também a experiência que os estudantes trazem do ensino secundário é muito baseada na memorização, na rotinização e muito pouco também na criatividade individual de trabalho, mas essencial de acordo. A 2ª questão, se por um lado o Mestrado foi subvalorizado? Seguramente que sim. Reporto-me a um comentário de uma pessoa da Universidade do Porto, o Professor Ferreira Gomes que na sequência da alteração da Lei de Bases em 2005, não é? Em que de repente foi descoberto o Ovo de Colombo de uma abordagem perfeitamente top-down o problema de Bolonha foi resolvido em Portugal, para a estrutura de graus. Dizia ele: “Isto só mudar os nomes, o antigo Bacharelato passa a Licenciatura, as antigas Licenciaturas de 5 anos ou de 6 passam a chamar-se Mestrados, basicamente a estrutura dos cursos mantém-se. Obviamente que o Mestrado no conceito de Bolonha é substancialmente diferente do Mestrado anterior, como o conceito de 1º ciclo é substancialmente diferente do anterior conceito de Licenciatura. Que foi concebido quando ainda não existiam mestrados. Portanto a ideia de passarem em Portugal de mestrados que demoravam no mínimo 7 anos de formação superior para o que é habitual, normal da Europa que tipicamente exijam 5 anos ou pouco mais de 5 anos de formação. O que não houve foi o cuidado, quando foi esta alteração da Lei de Base de ver todas as consequências que isto tem, nomeadamente em termos de contratação de, na função pública, em termos de estatuto da carreira docente, que só agora estão a ser revistos, porque obviamente isto tem implicações profundas. Quanto à questão das equivalências. Há instrumentos legais que forma desenvolvidos neste momento, muito desenvolvidos a nível dos Doutoramentos, o Professor Alberto Amaral esteve ligado na fase inicial a isso, sobre reconhecimento automático. Isso agora foi alargado para os 1º e 2º ciclos e portanto está facilitado e as instituições que estão a trabalhar com maior sucesso em termos de mobilidade, não têm esses problemas de reconhecimento de estudos porque isso é garantido à anteriori antes do estudante sair. São as instituições que não levaram tão longe o se European Mission Statement e portanto todas as implicações que isso tem que na prática estarão a ter maiores dificuldades. Deixe-me só dizer nos 5 segundos que ali estão. Nas avaliações que se têm vindo a fazer anualmente, e o Professor Alberto Amaral também, por essa Europa fora, de um modo geral as universidades europeias não estão muito melhor que nós neste tipo de problemas, portanto Portugal não está atrasado em relação à maior parte dos países.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado Senhor Professor.
 
Alberto Amaral
Bom. Eu fui aluno de Doutoramento numa das melhores universidades mundiais. A Universidade de Cambridge e assisti voluntariamente, porque na altura não era obrigatório, a algumas aulas teóricas. Mas eu nunca tive aulas tão más como naquela instituição. Mas é que o ensino em Cambridge não se baseava na transmissão de conhecimentos nas aulas formais. Era baseado muito numa relação dos professores com os alunos em trabalhos de investigação. A investigação, auxiliava…, era usada para criar os novos Licenciados. E pronto o que vai acontecer na Europa, desculpem lá, não é nada disso. Vai haver 2 tipos de instituições. Vai haver instituições de investigação que será Oxford, Cambridge, Zurich e mais não sei quê. E essas continuam a fazer o trabalho como costume, baseadas na investigação, não serão massificadas chamo a atenção para, por exemplo o MIT quantos alunos é que tem? Tem 6 mil. A Universidade do Porto tem 32 mil. Portanto são instituições pequenas. A excelência não existe aos baldes. Por exemplo voltando ao curso de Medicina, também tem um número de alunos muito controlado. Pois, não se massificou. Porque quando quiserem massificar o 1º ciclo nas várias áreas vão ver, vão cair nesse enorme problema. Daí que eu acho que os Senhores Ministros e a OCDE, etc. se estão de facto empenhados em acabar com a noção Europeia que as universidades são todas iguais. Pronto vai passar a haver universidades, que são universidades competitivas a nível mundial, e há países que vão investir seriamente em criar esse tipo de universidades. Por exemplo a Alemanha investiu 5 milhões, 5 biliões de euros para essas instituições competitivas a nível mundial. Por exemplo a Finlândia criou uma universidade fundacional em Helsínquia, por fusão entre a Universidade Técnica, Economia e Gestão e Arte e Design e um fundo inicial de 650 milhões de euros. E há um número de países que está a posicionar-se rapidamente para um sistema que de facto vai ser estratificado, com um 1º ciclo massificado, mas que será dado por instituições pós-liceais e pouco mais, onde não haverá a investigação que há nessas universidades competitivas, e um número muito pequeno de universidades muito competitivas. E nessas universidades de investigação, a questão de pedagogia nos docentes não se põe da mesma maneira que se põe em relação às instituições que fazem uma preparação do 1º ciclo e que são pós ensino secundário. Perdoem-me a expressão. Também é preciso ver outra coisa: eu tenho um colega americano que diz que os europeus são malucos e que não é possível implementar Bolonha em menos de 25 anos. Ou seja, nós se de facto quisermos implementar Bolonha a sério, com mudanças de paradigma etc, etc, não, dizendo que no ano 2010 está tudo feito; não está nada. Está feita a parte formal da estrutura. Agora propriamente a parte substantiva essa vai demorar muitíssimos mais anos a construir. E portanto nós devemos apostar muito nessa ideia de que tipo de sistema de ensino superior é que a gente quer.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado Sr. professor. António Fonseca do grupo roxo.
 
António Fonseca
Muito boa tarde a todos. Boa tarde Srs. professores. O processo de Bolonha tem como principal objectivo o ensino à distância. Pretende uma maior autonomização dos estudantes. A minha pergunta é a seguinte: até que ponto esta autonomização sem uma tutoria eficiente não poderá ter um efeito contrário ao pretendido? Obrigado.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado António. André Mota do grupo castanho.
 
André da Silva Mota
Muito boa tarde Srs. professores. Tendo algum conhecimento e tendo participado na Universidade do Minho, nos órgãos do governo da universidade, na Associação Académica, tendo participado nestas matérias, eu queria abordar aqui, queria ir um bocadinho pela castração da diversidade das universidades, voltar um bocadinho a esse tema, e tentar colocar em debate o que acontece em termos de pressão, em termos da comunidade docente, que é exercida nesta fase. Concordando se calhar um bocadinho com o seu colega americano, julgo que não vai ser nos próximos tempos que vamos sentir algumas dificuldades, bastantes dificuldades na minha visão. Vamos ter muita pressão sobre a comunidade docente porque não vai haver dinheiro suficiente nem para segurar este sistema muito mais tempo, a qualidade do sistema vínhamos a evoluir, Portugal vinha a evoluir em termo das suas estruturas, conhece bem a Universidade do Minho e sei que o Professor Sérgio Machado dos Santos fez um bom trabalho aí nessa altura, ainda no meu 1º ano da Universidade, apanhei o seu último ano de reitor, portanto sei que ainda estava a universidade em construção e as outras universidades como a de Aveiro, do Porto e outras, ainda estava no processo de construção, portanto verifico esta pressão dos docentes que poderá levar a um cooperativismo maior da comunidade docente, não criando a discussão dentro das universidades, criando também uma pressão muito financeira porque não haverá grande espaço para criar, terá de ser tudo muito racionalizado, também decorrendo das situações económicas que vivemos em termos mundiais, temo uma grande qualidade de ensino nacional e queria ver esta questão discutida. Obrigado.
 
Alberto Amaral
Bom, quando eu fui aluno na Universidade de Cambridge, cada dois alunos tinham um tutor científico; além do mais tinha um tutor moral porque o aluno deslocava-se para longe da família e portanto tinha um conjunto de obrigações, tinha um tutor para as questões de natureza moral e etc. Depois tinha um tutor científico, os alunos tinham um tutor científico. E o tutor científico reunia com os alunos todas as semanas, duas vezes por semana, e porque é que a s aulas não interessavam? Porque ele dizia, olhe você tem 15 dias, daqui a 15 dias traz-me 15 páginas escritas sobre o princípio da termodinâmica, vai para a biblioteca, os livros são estes por isso desenrasquem-se. E portanto o aluno era devolvido a ele próprio, a trabalhar por si, a apresentar trabalho, e a discutir com indivíduos que estavam dedicados aquele trabalho com os alunos. Ora o problema é que esse ensino é extremamente caro. Não tenho problema nenhum em dizer que Bolonha é usado há muitos anos na Universidade de Oxford e de Cambridge e mais não sei quê. Não me parece que seja possível usar por exemplo Bolonha numa Faculdade de Direito com 50 alunos por professor. Portanto atenção que para nós conseguirmos implantar Bolonha, é necessário ter meios a sério. E aquilo que nós estamos a observar é, pela 1ª vez um esforço de implementação da reforma. E não estou só a falar de Portugal, estou a falar de toda a Europa em que as reformas são implementadas sem nenhuma verba específica para o fazerem. Porque os governos partem do princípio: bom eles agora no fim de contas, eles antigamente tinham cursos de 4 anos e agora têm cursos de 3. Portanto com as economias que fazem, os cursos de 3 anos que se desenrasquem e que vejam se conseguem. Só não fazem porque não querem ou porque não podem ou porque são estúpidos ou não sei o quê. A pressão sobre os docentes claro que existe; existe uma pressão de há longos anos e essa pressão não é uma pressão nacional, é de novo e eu diria que é uma pressão global. É um facto que o que conta para a progressão na carreira docente. Que não é a componente pedagógica, é a componente de investigação. Acerca de alguns anos atrás, o sistema começou a ser discutido por uma fundação, nos Estados Unidos que atribuiu verbas muito significativas para isso, eles, os ingleses têm uma noção muito engraçada e que é a noção de scholarship. Não é propriamente investigação é scholarship é erudição. Eles o que dizem é que se foi definida uma scholarship, para a investigação, por exemplo, eu não copio o trabalho do meu colega, é uma vergonha; os meus resultados do meu trabalho têm de ser reprodutivos por outros investigadores, etc portanto isto está tudo estabelecido, não há uma scholarship do ensino. E portanto eles estão a investir seriamente ter grupos de pessoas a estudar essa questão que é muito significativa e que é fundamental. É que não há nenhuma metodologia para definir os scholarship do ensino a nível do superior. E portanto nós hoje quando fazemos um concurso, as pessoas o que fazem é contar o número de trabalhos e ver o factor de impacto e fazer as contas e dizer este deve ser 1º, este 2º e este 3º e raramente as questões pedagógicas entram em linha de conta.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
A questão da tutoria obviamente que no ensino centrado no estudante a questão da tutoria é fundamental. E põe-se frequentemente esta questão: como é que é possível com os mesmos docentes fazer também a tutoria e portanto sem recursos adicionais, mas a questão não pode ser posta exactamente assim, não é manter as mesmas aulas magistrais as horas de contacto e sobre isso pôr a tutoria. Uma vez mais voltando à experiência do curso de Medicina foi possível com rácios que funcionam para as outras instituições, até digamos com um número ligeiramente inferior para economizar dinheiro para poder lançar a investigação e montar alguns laboratórios pôr o sistema a funcionar, embora com sobrecarga dos docentes diga-se de passagem, porque o curso de Medicina excepcionalmente numa semana poderá haver 2 ou 3 horas de aulas magistrais mas a maior parte da semana há a auto-aprendizagem, há tutorias portanto não há esse tipo de aulas. Portanto é uma organização completamente diferente. O que acontece quando é possível transformar um curso totalmente nestas metodologias centradas no aluno com modelarização do ensino, por exemplo em Medicina são módulos de 4 semanas de auto-aprendizagem que terminam em avaliação, os docentes que estão envolvidos num determinado módulo, durante essas 4 semanas não fazem rigorosamente mais nada. Não fazem gestão, não fazem investigação, é ensino o tempo todo. E estão permanentemente disponíveis para os estudantes. O que acontece é que com essa modelarização os docentes estão em média envolvidos em 3 ou 4 módulos. Portanto quando olhamos globalmente para o ano completo, eles têm mais de metade do ano que fazem só investigação sem ter que pensar no ensino. Conclusão: a produtividade da investigação aumentou, apesar da aparente aumento da carga docente, o centro de investigação já teve duas avaliações com avaliação de excelente e partindo do zero, e a produtividade científica está exactamente ao nível dos outros dois centros de referência do Porto, do Minho e do Ipatimup e do BMC com o mesmo tipo de produtividade. Portanto a forma de organização do ensino também pode ter um grande impacto depois no desenvolvimento da investigação. Portanto não podemos ver a questão da tutoria dentro da organização tradicional. Em cursos que é preciso, que não foram estruturados tendencialmente dessa maneira, são precisos recursos adicionais que não estão a ser feitos, nomeadamente e principalmente para a preparação do que eu chamo de coursewear do regime do elemento de trabalho. Naquele curso os alunos quando no dia não sei quantos entravam, tinham num computador, numa intranet acesso para a palavra-chave, a programação de todo o ano, não se esquecem o que vão fazer no dia 5 de Maio se não for a um sábado ou um domingo, sabendo exactamente o que iam fazer onde e já lá tinham ao material base disponível e os links para a informação adicional. Ora esta preparação inicial exige recursos adicionais portanto não houve a percepção política para isso e foi pena. Quanto à questão das pressões sobre os docentes, eu concordo com o que o professor Alberto Amaral disse, e só acrescentava aqui um elemento: continuo a ter realmente um grande optimismo em relação ao efeito pedagógico das formas como ultimamente estão a ser concebidas para os processos de avaliação. Responsabiliza mais as instituições. A questão do plano qualidade. As instituições estão a ser convidadas a definir objectivos muito concretos no domínio do ensino com objectivos, acções a desenvolver, identificação de indicadores, portanto instrumentos de medida, monitorização desses indicadores, avaliação no fim do ano, um relatório e um plano de acção para corrigir o que está menos bem. Isto vai dar, é um primeiro passo para o conceito de scholarship apesar de tudo alguns indicadores de desempenho docente, não só dos docentes mas dos ambientes de aprendizagem, das próprias estruturas de apoio que eu estou convicto que dentro dos próximos 10 ou 15 anos, Bolonha nos próximos 10 anos já estão perspectivados, e que nos próximos 10, 15 anos vão ter alguns efeitos positivos. Aí ainda não perdi o meu optimismo.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado Sr. Professor. Joana Romão do grupo laranja.
 
Joana Romão
Boa tarde professores. Gostaria de saber se consideram que os professores do ensino superior quando reformaram os cursos para se enquadrarem no processo de Bolonha compreendiam que se queria ter licenciaturas de três anos, com a consequência de se ter menos formação, e não licenciaturas de 5 anos compactados em 3. Digo isto porque eu como aluna que passou pelo processo de Bolonha foi isto que eu senti. Obrigada.
 
Pedro Rodrigues
Obrigada Joana, Diogo Tadeu do grupo rosa.
 
Diogo Tadeu
Boa tarde a todos, principalmente aos professores, a minha opinião está muito ligada ao facto de eu ser dirigente associativo e a opinião que eu vou aqui traçar está relacionada com a Universidade de Coimbra e não é uma opinião generalizada. Muito bem; se a componente teórica está equiparada a outras instituições europeias ou deveria estar por este processo de Bolonha, as diferenças abismais devem estar na componente prática. Apesar da lei de base do financiamento do ensino superior ter levado à criação de um regime de prescrições em 2004/2005, até hoje na universidade de Coimbra não houve nenhuma prescrição. Devido a esta situação culpam-se os alunos por não estarem a ajudar numa melhoria da qualidade de ensino pois gastam verbas desnecessárias e envelhecem o corpo estudantil. A minha pergunta é a seguinte: o facto de haver 1200 docentes para 20.000 estudantes, não está também a prejudicar uma melhoria gastando verbas astronómicas e envelhecendo o corpo docente? Se para fazer face à economia, à crise económica, peço desculpa, se está a despedir, despedir entre aspas, os alunos do ensino superior, porque não fazê-los aos docentes? Muito obrigada.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
Bom eu penso do que se disse anteriormente a primeira pergunta que foi agora feita está respondida, há realmente casos em que a adaptação de Bolonha foi uma operação de cosmética, uma compactação de conteúdos e isso foi a abordagem formal. São os tais aspectos que agora é preciso corrigir. Portanto é realmente fundamental envolver os estudantes na determinação do que é o número correcto de créditos ECTS portanto medindo os seus workloads reais, e tomar isso em atenção e portanto fazer as correcções devidas, é preciso rever esta forma apressada, mas quando em 2005 se transformou a lei de bases e criou-se quase um ambiente nacional de que era um factor de prestígio, uma instituição ter mais cursos adaptados, uma autêntica corrida à adaptação de cursos, o que foi uma tolice e ainda por cima fez-se isso sem estar previamente em vigor o processo da acreditação desses novos cursos e da adaptação. Por exemplo na Alemanha que é claramente atrasada em relação a Portugal nos estabelecimento do sistema de avaliação, o sistema da acreditação desenvolveu-se rapidamente porque os novos planos de estudos dentro de Bolonha tinham que passar obrigatoriamente por um processo da acreditação. Em Portugal em Janeiro de 2003 com o ministro Pedro Lynce saiu a Lei 1/2003 que introduzia o conceito da acreditação académica que eu não tive tempo de levar ao terreno, A professora Emília da Graça Carvalho estava a fazer algum trabalho, em 2005 fez-se tábua rasa sobre isso, as primeiras acreditações de cursos vão ser feitas agora, pela nova Agência a começar em 2010, portanto sete anos depois do conceito de ser introduzido na lei. Se estivesse estado em vigor um processo de acreditação credível, muitos destes casos não tinham acontecido. Tinha demorado mais tempo, as propostas eram chumbadas e as instituições tinham de pensar a sério a adaptação a Bolonha. Tem a ver com as operações de cosmética. Na intervenção relativa à experiência na universidade de Coimbra, foram levantadas várias questões e nomeadamente eu não percebi bem a parte final a dos rácios se considerava os rácios demasiado favoráveis ou demasiado desfavoráveis. A percepção que eu tenho em relação aos rácios aluno/docente em Portugal com a comparação com muitas outras universidades europeias em que tenho estado em avaliação, é que não são propriamente desfavoráveis, o tipo de enquadramento é que o é em vários aspectos. E nomeadamente num deles (que agora penso que será resolvido) com o novo estatuto e que acho que não tinha sido resolvido que é a possibilidade de envolver bolseiros de investigação em alguma actividade pedagógica ao nível de monitor e ao nível de componentes práticas com duplo benefício. Para a instituição, mas também para os bolseiros porque hoje em dia em termos curriculares é muito valorizada a experiência de ensino mesmo em pessoas que estão mais dentro de uma cadeira de investigação ou que enveredam por trabalhos de investigação. Até aqui é um bocadinho à socapa num caso ou outro, mas em princípio havia uma incompatibilidade de envolver bolseiros em actividades docentes. E pronto eu ficava por aqui.
 
Alberto Amaral
De novo, alguns problemas que foram levantados não são problemas nacionais. Por exemplo o facto da compactação dos planos de estudo em três anos verificou-se em muitos outros países. Tem tido como efeito uma diminuição da mobilidade dos alunos porque o aluno deixou de ter esse crédito das opcionais que era o com o que ele jogava quando ia para o estrangeiro, que era mais fácil de obter que eram as valências opcionais do que as valências não opcionais. Como as opcionais desapareceram eu devo dizer que sendo um dos avaliadores da Direcção Geral no meu caso da Saúde, muitas das propostas dos cursos que me chegam às mãos não têm disciplinas opcionais mas essa noção de compactação existe a ponto de por exemplo a Itália esse cursos serem conhecidos pelos cursos bonzai, aquela árvore chinesa que é mais pequenina do que não sei quê, mas é a que dá frutos como a pereira e tal. Os cursos bonzai são os cursos de 5 anos e passaram a ter três anos mas que tem lá tudo dentro; essa designação existe. Depois para mim eu sempre fui relativamente contrário aos ECTS. Para mim o ECTS é mais uma burocracia, um bocado introduzida a martelo. É evidente que se eu mudar de professor a uma disciplina eu devo mudar de ECTS porque dois professores não dão a mesma disciplina da mesma maneira nem o grau de dificuldade é o mesmo pá, e as pessoas estão rapidamente a chegar a mesma conclusão que o ECTS não é o euro. Porque a ideia é de haver um euro para o ensino superior que permitisse trocar. Eu tenho 10 euros de Química da Universidade do Porto quero 10 euros de Química da Universidade de Coimbra. É pá mas aquilo não existe porque aquele euro é diferente. Mais, muitas vezes a introdução da ECTS dificultou, porque quando eu tinha propostas de planos de estudo, o aluno tem microrgânica, tem inorgânica tem vários estudos a mesma coisa. Agora não o aluno vem com química orgânica ECTS a minha tem 9, como é que é? ECTS de Coimbra… Tem química orgânica que tem ECTS da química do Porto, tem 7 ECTS de Coimbra… A gente não pode aceitar isto, pá. Mas nem sempre essa maravilha de simplificação ligada ao ECTS funcionou e muitos casos tem sido negativa. Não gostava de comentar o caso de Coimbra porque não conheço a situação. Eu gostava de fazer um comentário do tempo em que eu fui reitor da Universidade do Porto. É possível despedir do Centro Universitário, nós despedimo-nos quando introduzimos a reforma do financiamento, fizemo-lo por causa das medicinas foram cursos em que a Universidade do Porto, houve uma redução significativa dos quadros disponíveis, exactamente porque foi essa opção que os reitores tomaram em conjunto em razão às diversas universidades. Portanto não é verdade de que não seja possível fazer esse despedimento.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado professor; vamos continuar para o último bloco de discussão dos grupos e dou a palavra ao Pedro Cunha do grupo encarnado.
 
Pedro Cunha
Boa tarde Srs. Professores Alberto Amaral e Sérgio Machado dos Santos. A questão que eu vou abordar já foi de certa forma tocada ao de leve pelo professor Sérgio Machado dos Santos na resposta a uma das questões anteriores de qualquer das formas, eu gostava de a ver mais aprofundada e obviamente também gostava de ouvir o Sr. Professor Alberto Amaral. É uma questão colocada e virada para o futuro. Numa altura em que tanto se fala da avaliação de professores, eu pergunto como é que um bom modelo de avaliação dos docentes do ensino superior poderá, de certa forma, ajudar a retomarmos o rumo inicial da declaração de Bolonha, e os princípios que a levaram à sua realização? E já agora aproveito a oportunidade de perguntar o que é um bom modelo de avaliação dos docentes do ensino superior. Lembro apenas que um dos princípios da declaração de Bolonha é a responsabilização individual, ela deve ser obviamente incutida aos alunos mas também aos docentes. Esta é uma questão fundamental. Obrigado.
 
Pedro Rodrigues
Obrigado Pedro. Luís Abreu do grupo bege.
 
Luís Abreu
A pergunta do grupo bege é a seguinte: houve algum cuidado em iniciar diligências com os empregadores para explicar as diferenças nas qualificações dos graduados pós-bolonha?
 
Alberto Amaral
Não. Tanto quanto eu sei e de novo isto não é um problema nacional. É um problema a nível europeu. Os empregadores foram relativamente pouco auscultados em relação a esse tipo de questões. E mais: quando auscultados, de uma maneira geral, não respondiam, não sabiam responder. Eu fiz uma avaliação de uma universidade holandesa que tinha um equipa nomeada pelo ministro onde entre 5 pessoas, 3 delas eram representantes da indústria holandesa. Disseram-me que a ideia dele foi mostrar à universidade o que é que os alunos deviam saber, para responder às necessidades da indústria holandesa. Ao fim de um ano de diligências chegaram à conclusão que não sabiam, ou seja que não é possível prever com certeza o que é que a indústria holandesa precisa daqui na 4 ou 5 anos nos diversos domínios. Portanto também é preciso olhar, ter um bocado de cuidado nesta questão dos empregadores. Quanto à avaliação dos docentes, é preciso saber que tipo de docentes é que vocês querem? Estamos a falar de um docente de uma universidade de investigação? Oxford que é melhor do que não sei quê ou Harvard ou estamos a falar de um docente de uma nova escola, liceu avançado que vai dar a um 1º ciclo de Bolonha classificado. Porque estes dois professores têm de ter competências completamente diferentes com características completamente diferentes. E o grande mal é nós tentarmos criar um sistema uniformizado para isto tudo, aliás acho que isto está a ser criado em Espanha e que só terá efeitos negativos no desenvolver da profissão e no grau de satisfação do corpo docente, que também é fundamental dentro de uma instituição universitária.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
Eu passava também pela última questão e concordando com a resposta dada, não, não houve esse trabalho e eu insisto numa questão que já levantei há momentos. Essa até era uma questão importante quando foi definido o quadro nacional de qualificações que é fundamental haver empregadores e associações profissionais. O que não foi feito. Aí também temos que reconhecer que as instituições de ensino superior tiveram que fazer a adaptação a Bolonha sem instrumentos fundamentais como esse. Também tiveram que trabalhar um bocado no arame sem rede, não é? Portanto também temos que reconhecer que o ambiente não foi o melhor para isso, embora continuo a pensar que se poderia ter feito melhor. Por outro lado também concordo, e aliás há os relatórios que puseram muito em evidência quando se pergunta aos empregadores que tipo de formações desejam as mensagens são extremamente contraditórias. Desde empregadores que querem os Licenciados prontos, entram num dia e a serem produtivos no dia seguinte, até outros que dizem, e às vezes com a máquina x em com outros não, isso não nos interessa minimamente. Queremos pessoas de espírito aberto, capazes de se adaptar, capazes de compreender a mudança, adaptar à mudança, ou até de ajudar a liderar a mudança que nós nessa formação específica cá fazemos. Fazemos a indução. Queremos pessoas pensantes e portanto as mensagens são contraditórias. Pronto, quanto à avaliação dos professores, eu penso que como tem sido a evolução na avaliação da função pública e com o que aconteceu no ensino secundário e isso tudo o novo estatuto dificilmente foge também à questão da avaliação dos docentes. Até agora com o estatuto existente essa avaliação existia nos momentos de promoção e punham em ênfase, a meu ver exagerada na dimensão da investigação, praticamente ignorando a parte pedagógica. Seguramente que o sistema que venha a existir vem valorizar muito mais a componente pedagógica. O que eu posso dizer aqui também uma vez mais é a experiência prática da escola que ultimamente ajudei a construir onde de 2 em 2 anos, uma Comissão constituída pelos Catedráticos da escola faz a avaliação de todos os docentes da escola, em todas as dimensões de intervenção. Na dimensão ensino, investigação, na dimensão de serviços, e portanto de abertura à comunidade e na dimensão de atitudes apesar das dificuldades inerentes a isto. E não dar, enfim, não é a classificação “muito bom”, “bom”, embora também o faça, mas um conjunto de recomendações dizendo: “Este docente tem tido um desempenho francamente interessante nesta dimensão e nesta, tem que investir nesta por esta via, tem esta falha e nomeadamente está pronto para, por exemplo, se poder candidatar a umas provas de agregação ou a um concurso, ou não. Há estas componentes que estão em falha.” Docentes envolvidos e votada por unanimidade, portanto, aprovada e votada pelas próprias vítimas. Porque reconheceram que um factor de prestígio da escola era o grau de exigência que punham sobre os próprios docentes e sobre os seus mecanismos de promoção. Na dimensão ensino, por exemplo, o que é que é tomado em avaliação? A avaliação dos alunos, nos inquéritos que são passados aos alunos em todos os módulos, os resultados pedagógicos dos alunos, e não são só medidos em termos de conhecimentos, porque é um curso em que realmente as competências, quer específicas quer outras genéricas são efectivamente avaliadas, e a percepção dos próprios docentes, por exemplo, do coordenador do módulo em relação aos demais docentes que trabalharam aquele módulo. Nestes cursos trabalham muitas vezes equipas de 10, 15 ou mesmo 20 docentes e portanto há esta percepção cruzada. A investigação, são os parâmetros habituais são óbvios o dinheiro captado, a produtividade científica, os índices de impacto. E nas atitudes foi possível estabelecer uma grelha que tem uma grande aceitação apesar da sua subjectividade acho que tem sido positiva. Pronto é o inicio, começam a ser estudos de caso, mas enfim, há aqui muito trabalho a fazer, agora é fundamental também definir qual é o quadro jurídico, porque há outras escolas que se fecham e não querem fazer. Isto foi feito, não por imposição da universidade, mas uma opção própria da escola que acho que esse era um factor de prestígio também para a escola.
 
Dep.Carlos Coelho
Muito bem. Vamos então entrar na fase das perguntas livres também em blocos de 2. Este 1º bloco terá uma pergunta à distância e uma pergunta física. Nós estamos a fazer o broadcasting desta sessão pela net, mas não em sinal aberto. Portanto não é uma emissão para toda a gente é só limitada aos ex-participantes da Universidade de Verão. Portanto àqueles que estiveram nesta sala em 2003, 2004, 2005, 2006, 2007 e 2008 e este ano pela 1ª vez demos oportunidade a esses ex-participantes da Universidade de Verão de fazerem perguntas à distância. Temos uma pergunta de Humberto Monteiro que esteve numa Universidade de Verão anterior e que diz o seguinte: Diz que foi Presidente da Associação de Estudantes da Escola Superior de Tecnologias de Castelo Branco em 2007 e acompanhou o processo de Bolonha e a sua implementação. E constatou que em vez de se uniformizar o ensino a nível europeu, em Portugal fez-se uma adaptação conveniente em cada instituição. E tem uma questão que gostaria de colocar que é a seguinte: “Quando se acaba o Mestrado no ramo das Engenharias em alguns estudantes dos Politécnicos não têm entrada na Ordem dos Engenheiros e os alunos têm que fazer o exame à Ordem. Pois para quem paga as mesmas propinas e estuda os mesmos conteúdos o estudante sente-se defraudado. Pois em Espanha todos os estudantes ficam inscritos automaticamente na sua Ordem. Será que em Portugal temos o ensino de 1ª e o ensino de 2ª?” Esta é a 1ª pergunta da 1ª ronda e a 2ª pergunta será…
 
Pedro Rodrigues
A 2ª pergunta será de Miguel Silva.
 
Miguel Nunes Silva
Muito boa tarde aos dois. Eu gostaria de saber, uma vez que os dois já estudaram em profundidade este tema, eu gostaria de saber se há algum procedente histórico para esta tentativa de uniformização a larga escala e se tal procedente foi bem sucedido ou não? Muito obrigado.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
Começaria pela 2ª questão e dizer eu não tenho conhecimento, não sei se o Alberto tem, eu não tenho conhecimento de precedentes. Quanto à questão da pessoa de Castelo Branco o que está aqui em causa é que a Ordem dos Engenheiros instituiu um mecanismo de acreditação profissional dos cursos. Haviam cursos em que foram acreditados como tal o que significava que qualquer graduado para esse curso automaticamente tinha inscrição e outros que não foram, e isto abrangeu também pelo menos inicialmente algumas universidades. Houve algumas universidades do interior que tiveram alguns problemas com a acreditação. O processo pareceu um processo interessante razoavelmente credível com, a meu ver, um problema. Este problema de o que é que são os learning outcomes, portanto, os objectivos de aprendizagem em cursos profissionalizantes estava muito pouco definido, havia muito pouco trabalho nesse sentido, pelo menos na fase inicial. A Ordem dos Engenheiros usava muito a abordagem tradicional da organização do currículo a saber: Há Matemática ou não há? Há Física ou não há suficiente? Portanto, entrava pelo currículo, dentro daquele conceito quem fizer um determinado currículo em princípio adquire determinadas competências e não pela definição explicita de competências e, portanto, depois na avaliação das aprendizagens que é a parte mais difícil. Para a qual se está a caminhar, mas apesar de tudo é um processo com bastante credibilidade. A Ordem dos Engenheiros foi claramente a associação profissional que mais se distinguiu aí e essa percepção que eu tive é que nos casos em que não foi dada a acreditação ao curso automaticamente, embora não fosse negado aos seus jurados o acesso à Ordem, tinham que fazer exame, em princípio havia razões para tal que foram explicitadas à instituição e que teria a oportunidade de as corrigir e de submeter novamente ao princípio. Eu penso que o novo processo de acreditação acaba com este processo paralelo, portanto seja acreditado tem automaticamente efeitos profissionais de futuro… mas não tenhamos ilusões. Vai haver cursos que vão ser acreditados e alguns cursos que não vão ser acreditados e vão haver cursos que vão ser acreditados condicionalmente, por menos tempo, com determinadas condições que têm que ser satisfeitas e se não forem satisfeitas a acreditação poderá ser perdida. Portanto, penso que este foi mais um dos passos na evolução de um sistema de garantir qualidade no sistema. Por exemplo, ali muito próximo de Braga havia um caso de recusa e muito bem de acreditação de um curso de Engenharia que por exemplo admitia que pudessem entrar estudantes com zero a Matemática na prova específica. Acho que a Ordem do Engenheiros tinha toda a razão num caso destes, quer dizer, isto à partida não traz credibilidade nenhuma, não é?
 
Alberto Amaral
Bom. De facto a Ordem dos Engenheiros estabeleceu há uns anos atrás um sistema de acreditação que basicamente era o seguinte: aquela faculdade podia submeter o curso à acreditação da Ordem dos Engenheiros, se o curso fosse acreditado quem obtinha a Licenciatura era automaticamente membro da Ordem dos Engenheiros, se o curso não fosse acreditado teria que fazer um exame à Ordem para o exercício profissional. E este sistema mereceu alguma credibilidade nacional numa altura em que genericamente a nível de Ministério da Educação primeiro e depois Ministério do Ensino Superior nem sempre havia coragem de recusar a criação de novas formações. Esperamos que no trabalho da futura Agência essa coragem exista, embora surge aqui um problema muito delicado. O caso do aluno que, enfim, frequentou o 1º, o 2º e o 3º ano, etc. e no final nada o vale. Mas isso será o que teríamos que debater no futuro. De facto isto é um problema grave que o caso da Ordem dos Engenheiros resolveria via exame, mas que com a lei actual não o pode fazer. Também é verdade que houve posições de que essa atitude das Ordens não era constitucional. Ou seja, no fim das contas, uma vez o Estado, tendo o Estado aprovado uma determinada formação, não era constitucional que o Estado delegasse numa outra entidade que era uma Ordem profissional decidisse se a pessoa poderia ou não exercer a sua actividade profissional. Quanto a exercícios similares. (dois minutos inaudíves) É assim o método tradicional de fazer política europeia era pela publicação de legislação europeia. Os países delegavam competências em Bruxelas, Bruxelas produzia leis, os países tinham que conhecer essas leis e havia um tribunal que penalizava o país se não eles não obedecessem. O caso por exemplo do orçamento, do défice orçamental, etc. Quando se entrou numa área que era protegida pelos tratados, como sendo competência exclusiva dos países, no caso do ensino, no caso da segurança social, o caso do emprego, etc. áreas que são da competência de cada Estado. Não foi possível continuar esse tipo de delegações, no estabelecimento de leis de carácter europeu. Então inventou-se um novo método, que é chamado Método de Coordenação Aberta, segundo o qual os países se comprometem a atingir determinados objectivos ao fim de um determinado tempo, mas não há uma legislação europeia. Cada país terá que implementar a legislação nacional para atingir aqueles objectivos naquele período. E pronto, o que significa que essa nova metodologia que é a de coordenação aberta, embora seja eficaz sobre o ponto de vista de promover as mudanças, as alterações, etc. é muito pouco eficaz sobre o ponto de vista da coordenação. Portanto não se espantem se a aplicação de Bolonha nos diversos países depois não der os mesmos resultados em todos eles. Está na cara do método, o método é assim, foi assim que foi inventado, foi assim que é aplicado e portanto é muito possível que o Método de Coordenação Aberta faça as transformações, mas não faça bem a coordenação dessas transformações. E é esse o objectivo. O objectivo é manter a diversidade do país em influenciar as legislações que cada país produz.
 
Pedro Rodrigues
Muito obrigado Sr. Professor. De seguida Leonor Vieira e depois Jean Barroca.
 
Leonor Fanha Vieira
Boa tarde. Eu sou aluna da Faculdade de Direito de Lisboa e como devem saber o processo de Bolonha lá não foi muito bem recebido. Para além de não ter sido muito bem recebido só nos trouxe complicações. Complicações essas que até agora ainda não nos fizeram entender qual o benefício de Bolonha. Temos menos equivalências para a Europa, a qualidade de ensino perdeu-se e ficamos com menos cadeiras que eram bastante importantes na nossa formação, para além de termos de fazer Mestrado para poder aceder à Magistratura. Portanto gostaria de saber se nos poderiam dizer quais as vantagens. Obrigada.
 
Pedro Rodrigues
Obrigado Jean.
 
Jean Barroca
Boa tarde Srs. Professores. Eu devo dizer que de facto concordo com a visão que os estudantes têm muito mais rapidez em adaptar-se à mudança e têm também muito mais facilidade em aceitá-la. A análise que o Sr. Professor Alberto Amaral fez do ensino superior coincide em muito com o último paper que foi em preparação para a Convenção de Levine. Quando se fala de avaliação, quando se fala de rankings, os estudantes levantaram uma preocupação que, a meu ver, é muito pertinente. A diferença entra avaliação e rankings, e acreditação é muito, muito importante e é preciso vincá-la. Porque é verdade é que nós aceitarmos os rankings ou a avaliação como a forma de se distinguirem as instituições de ensino superior na Europa, nós estamos a abrir espaço, a abrir caminho para que se crie um mercado do ensino superior na Europa. Ainda mais com Bolonha com a facilidade das equivalências, a verdade é que as nossas universidades tanto a de Covilhã como a Universidade Técnica de Lisboa vão entrar imediatamente em competição com o resto das universidades da Europa. E agora põe-se a questão. Como é que vai ser feito o financiamento destas universidades? Vai ser feito pela sua omissão ou pela sua reputação? É um risco que está aqui muito, em cima desta problemática. A verdade é que o Professor Alberto Amaral falou-nos da criação de apenas 5 universidades de investigação na Europa, eu acho estranho… Pela análise que eu fiz do ensino superior português, nós temos mais do que 5 que se propõem ser mais do que universidades de investigação. Pela reserva que o Sr. Professor levanta, eu ponho essa questão do orçamento. O Sr. Professor falou do MIT e eu comparo o MIT a um caso muito português. E que me diz muito respeito. Comparo o MIT ao caso do Instituto Superior Técnico. Ambos têm 10 mil alunos. A diferença é que enquanto o Instituto Superior Técnico tem 100 milhões de euros de orçamento anual, o MIT tem 7500 milhões de euros. A verdade é que as duas escolas têm 1000 professores, mas talvez pela diferença de financiamento, o MIT tem já 73 prémios nóbeis e eu não conheço nenhum no Instituto Superior Técnico. O Sr. Professor tem responsabilidades na Agência Nacional de Avaliação e Acreditação e já que estamos a falar de orçamentos, a dúvida que eu lhe ponho também terá a ver com a existência ou não de orçamento para avaliar e acreditar o ensino superior português. Perante todos estes problemas, perante todos estes riscos, termino imediatamente dizendo que sem uma aposta forte no ensino superior português, e perante a inactividade e perante a paciência com que todos olhamos, como toda a comunidade académica olha para o ensino superior, haverá ou não a possibilidade de estarmos como o Sr. Professor Adriano Moreira diz, perante um Estado exíguo, pela não existência de uma sociedade de conhecimento no nosso país? Eu prometo que me calo já. Eu só tenho que fazer este à parte porque não me consigo conter. Sr. Professor Sérgio Machado dos Santos disse que dia 5 ou 6 de Maio se fosse Sábado ou Domingo, provavelmente não haveria planeamento. Eu digo-lhe que se fosse dia 8 de Setembro e fosse Domingo, eu conheço alguém que acabou o curso. (palmas)
 
Alberto Amaral
Portanto não há dúvida nenhuma que um dos objectivos do processo de Bolonha é que é o mercado do ensino superior. Se você ler um livro que a gente publicou sobre o mercado do ensino superior diz exactamente isso. Um dos objectivos de Bolonha é criar o Levelfield onde é possível fazer esse tipo de trabalhos. O que tem acontecido infelizmente é que para ser possível 27 ou 28 países assinarem o mesmo documento, as palavras do que está escrito nos vários documentos dizem muito pouco. Eu e o meu colega Anison chamamos a isso weasel Word. Weasel é fuinha e uma das habilidades da fuinha é pegar num ovo fazer-lhe um furo, esvaziar o ovo e o ovo fica perfeitamente inteiro, simplesmente não vale nada lá dentro. Portanto o weaselword tem o mesmo significado nos tratados europeus. E portanto o que os ministros fizeram na sua reunião de Bruxelas, foi falar em métodos multidimensionais de análise que em boa verdade não significam nada como forma de estabelecer um ranking e os alunos tentaram opor-se a esse tipo de redacção e tornava mais precisa por forma a ser proibido ou a não se caminhar tão rapidamente para o sistema de rankings. A resposta da comunidade foi que infelizmente já tinha feito contrato com outra instituição e que portanto já tinha encomendado o trabalho, já tinha pago e tal. Portanto já não havia volta a dar-lhe, e ficava mesmo assim como estava e ponto final. Portanto eu concordo consigo em que nós vamos caminhar infelizmente, quer pelo lado da Europa, quer pelo lado da OCDE para um sistema que vai no fim estabelecer um sistema rankial deste ensino superior. Seja pela versão simplificada, do Carnegie Mail   onde se dá a transposição que a União europeia está a tentar, seja pela via que a OCDE está a tentar. E a minha previsão é que quem vai ganhar vai ser a OCDE. A OCDE vai ganhar porque no fim vai dizer, a nossa metodologia é que é a metodologia científica. Porque nós medimos os outputs e vocês pura e simplesmente fizeram a classificação, e portanto há uma base científica pelo qual deve ser de facto dada a preferência à visão da OCDE. Eu não disse que eram 5 eu disse que seriam poucas. Poucas e provavelmente a proporção não andará longe da americana 200 para 4.000. 200 universidades de investigação para 4.000 de instituições do ensino superior. E infelizmente existe um documento da União europeia produzido pela União Europeia que diz que o investimento no ensino superior deve ser eficaz. Para que o investimento seja eficaz é necessário que ele seja feito o mais perto possível da fronteira do conhecimento. Significando isto que países mais atrasaditos se devem dedicar ao ensino primário e secundário e países mais avançados devem-se dedicar ao ensino superior. Aliás se você aplicar a mesma lógica que aplica por exemplo ao fabrico de cereais, países que têm terrenos planos como a Espanha e a Polónia ou não sei o que é, fazem saber que vendem mais baratos que os de Portugal. Portugal não deve fazer cereais não é. Se calhar pela mesma razão Portugal não deve fazer doutoramentos; deve mandar as pessoas doutorar-se em Inglaterra ou nos Estados Unidos e viver com esses produtos. O Direito é complicado. De novo e similarmente ao que eu fiz com a Universidade de Coimbra, eu não posso pronunciar-me em detalhe sobre o processo de Direito porque não conheço o processo de Direito. Aliás o que você diz é extremamente grave e se eu levasse à letra aquilo que você diz, o curso de Direito de Lisboa não seria acreditado.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
eu conheço mal o curso de Direito mas pelo que disse isso é claramente um caso em que valia a pena ter esperado mais, Bolonha e o compromisso era até 2010 de ter os cursos e ter-se aprofundado a questão. A meu ver poderá ser uma consequência da falta de coordenação política que houve deste processo. Em 2005 foi estabelecida uma estrutura para coordenação em que foi nomeado um coordenador. Passado pouco tempo estava a dialogar em discordância com o ministro através da comunicação social e nunca chegou a actuar. Portanto as instituições tiveram de trabalhar sem qualquer coordenação, portanto só por sua iniciativa, sem qualquer intervenção. O Conselho de Reitores podia ter assumido esse papel mas também não o quis fazer, a Fundação das Universidades Portuguesas poderia ter tido esse papel porque tem comissões temáticas por especialidades, mas também não teve a dinâmica para o fazer, e o trabalho que se tinha começado em 2004 com a professora Maria da Graça Carvalho de procurar trabalhar por áreas temáticas, vê qual é o panorama europeu e procurar convergência em termos de organização dos ciclos, em termos de convergência europeia por áreas e não na totalidade porque cada área tem a sua especificidade e não teve sequência, foi completamente abandonado depois em 2005, e portanto possivelmente estamos aí nesse caso a sofrer as consequências dessa falta de coordenação. Quanto ao papel dos estudantes, no período 99/2001 que acompanhei o Bolonha follow up group, fiquei extremamente impressionado com a actuação da ESIB na preparação de dossiers, os estudantes foram muito mais pró-activos que as instituições de ensino superior claramente, ganharam a questão fundamental de introduzir e muito cedo nos comunicados das reuniões ministeriais a questão de  dimensão social  do ensino superior, nomeadamente o conceito que o ensino superior um bem público que constitui uma responsabilidade pública, e reparem que isto não tem só implicações no financiamento; tem muitas outras. É algo de que os poderes públicos se não podem alhear, nomeadamente em termos de avaliação. A meu ver, este conceito valida a obrigatoriedade de uma avaliação externa, porque se é um bem público, quer governos quer sociedade em geral não se podem alhear da sua qualidade, nomeadamente pode ter muitas implicações. E os estudantes batalharam por isso. As questões do financiamento preocupam-me muito. Eu não compreendo o que se passou nestes dois ou três últimos anos principalmente no financiamento do ensino superior, principalmente quando o respectivo ministério teve um acréscimo de financiamento mas um desvio tal de verbas para a dimensão da investigação fora das instituições do ensino superior e sem mecanismos que permitissem por exemplo nomeadamente com acréscimo de bolseiros pós doc, bolseiros de doutoramento darem algum apoio no ensino porque esses mecanismos não existiam, como é que foi possível com Bolonha implementação estrangular financeiramente as instituições como foram estranguladas. Assim como não compreendo e vem muito ao arrepio do que se passa em vários outros países europeus, que as instituições vão ter de pagar na íntegra a Acreditação dos seus cursos, portanto a avaliação externa. A avaliação externa resulta desta dimensão social, do ensino ser um bem público e portanto é também uma responsabilidade do Estado. Portanto não compreendo também essa posição. Fala-se a nível europeu do objectivo de investir 2% do PIB no ensino superior. Penso que Portugal está à volta do 1.1, entre 1.1 e 1.2. Portanto se este objectivo europeu for cumprido, eu estou convicto de que é possível com racionalização, porque havia realmente gastos supérfluos, no ensino superior nomeadamente em termos de todos os abandonos e que havia má organização de ensino, permitir a estudantes retidos porque um determinado docente tem uma maneira muito peculiar, por exemplo conduzir as suas disciplinas, e tem que haver capacidade de adaptação. Se realmente se cumprisse os 2% do PIB, as instituições do ensino superior eram capazes de realmente ir muito longe. Penso que parte deste dinheiro tinha de ser competitivo, não era só colocar mais dinheiro nas instituições. Tinha de ser com objectivos muito bem definidos, contratualizados e aí era possível fazer algumas pequenas maravilhas.
 
Dep.Carlos Coelho
Muito bem chegamos ao fim da fase de perguntas e respostas. Havia muitos outros inscritos mas infelizmente não temos tempo. Eu iria perguntar aos nossos convidados Prof. Alberto Amaral e Prof. Sérgio Machado dos Santos se nos querem dirigir uma palavra final de dois minutos, última mensagem que considerem importante. Houve questões que não foram levantadas, ou qualquer coisa sobre Bolonha que nos queiram dizer, que não tiveram oportunidade de dizer até agora. Se assim for o Prof. Alberto Amaral e o Prof. Machado dos Santos teriam dois minutos para fazer uma declaração final.
 
Alberto Amaral
Ora bem. Eu essencialmente chamo a atenção para o seguinte que é que, é necessário que Bolonha não é necessariamente um mal nem nenhum diabo, nem o quer que seja. É preciso é que as pessoas estejam atentas e tenham uma visão crítica em relação ao que está a acontecer nos diversos países. E o que lamento é que seja muitas vezes apenas os alunos aqueles que exercem essa tarefa. Não se vê muitas vezes por parte nem dos Conselhos Coordenadores, quer por parte dos professores esse tipo de atitude. E é fundamental perceber qual é a evolução do sistema, quer dizer, o que é que vai ser o sistema de ensino superior na Europa? Infelizmente o Parlamento Europeu também não funciona.
 
Eng.Sérgio Machado dos Santos
Penso que uma das dificuldades que vivemos, nomeadamente em Portugal é a falta de uma definição clara de qual é a política nacional para o ensino superior que, a meu ver, não foi definida e continua a não estar definida, e portanto e se não dissermos muito bem para onde é que queremos ir também é difícil definir os caminhos. E é esse respeito e numa das muitas intervenções que fiz sobre o processo de Bolonha eu defendia, o que eu daria um conjunto de linhas orientadoras para as políticas nacionais que estivessem definidas podiam ajudar muito na eficácia do processo de Bolonha, ia rapidamente apresentar o que eu defendia então. Defendi um sistema de ensino superior com grande diversidade de formações a nível da pré-graduação do 1º ciclo, que dê resposta à multiplicidade de vocações e interesses e capacidades individuais dos formandos, com uma grande flexibilidade na organização dos percursos curriculares, com metodologias de aprendizagem motivadoras e propícias à aquisição de competências de natureza pessoal e inter-pessoal que são imprescindíveis no quadro das profissões de hoje e de amanhã, com níveis elevados de qualidade face aos objectivos de formação, reformulados, com possibilidade de certificação de qualificações ao fim de períodos mais curtos de formação. Um sistema de ensino superior que aposte em atrair para formação no 2º ciclo, tanto de perfil científico, como de carácter profissionalizante todos os graduados do 1º ciclo que tenham demonstrado capacidade para tal. Um sistema de ensino superior que promova a investigação e desenvolvimento em estreita articulação com o ensino, que fomente a transdisciplinaridade e o equilíbrio entre em investigação básica e investigação orientada, que seja sensível aos problemas societais e que procure captar os melhores 15 a 20% dos estudantes de Mestrado para prosseguirem estudos de Doutoramento proporcionando-os para o efeito as devidas condições financeiras. Um sistema de ensino superior em que o seu carácter binário assente numa indicação clara dos elementos que são comuns e dos elementos que são distintivos entre as duas modalidades de ensino, universitário politécnico, distinção essa centrada na natureza dos ensinos praticados e não no plano institucional. Um sistema de ensino superior que no plano da qualidade e avaliação interiorize o princípio que é a responsabilidade primeira pela qualidade reside nas próprias instituições de ensino superior; em seguinte, um sistema superior que com base em critérios e padrões de nível europeu granjeiam uma imagem de qualidade e deixa a sua relevância inequivocamente desconhecida pela nossa sociedade. Se nós definíssemos um grande consenso político à volta destes objectivos seria mais fácil levar bem mais longe o processo de Bolonha.
 
Dep.Carlos Coelho
Muito obrigado. Eu quero agradecer aos dois Professores que, repito, não são da nossa área política, são académicos independentes que fizeram o favor de vir até nós. Todos eles vieram aqui interromper os seus planos pessoais para palestrarem para nós. O Professor Sérgio Machado dos Santos não levará a mal que agradeça de forma especial ao Professor Alberto Amaral que veio do estrangeiro a conduzir, está de regresso de férias, teve que fazer uma alteração com a família para parar aqui para estar connosco e depois amanhã continuará o seu caminho de regresso à cidade do Porto. Agradecemos muito aos dois o debate que nos proporcionaram, com as respostas às questões, foi um grande prazer ter pessoas com qualidade humana e académica dos Professores Alberto Amaral e Sérgio Machado dos Santos connosco. (palmas)